Artista plástica, ex-aluna de Guignard. Maria Helena Andrés tem um currículo extenso como artista, escritora e educadora, com mais de 60 anos de produção e 7 livros publicados. Neste blog, colocará seus relatos de viagens, suas reflexões e vivências cotidianas.
segunda-feira, 28 de janeiro de 2019
ARTE E CRIATIVIDADE III
No processo de criação podemos destacar atividades
físicas, intelectuais e psicológicas, que combinadas se estruturam em
determinadas formas de expressão.
A criatividade compreende:
A sensibilidade, para perceber, sentir; a
imaginação, para criar; o gosto, para selecionar; a memória, para reter; a
inteligência e intuição para organizar; a vontade, para realizar. A vontade
sobretudo, é elemento indispensável à
criatividade. Sem ela de nada adianta os outros elementos.
A criatividade passa por etapas que vão da motivação
à realização. Se vemos determinada coisa que nos sensibiliza, uma paisagem, as
manchas de um muro velho, as nuvens que se formam no céu. Ouvimos determinada
música, lemos um trecho de um poema ou de uma estória. Desejamos expressar
aquela emoção que a música ou o poema nos proporcionam.
Às vezes queremos transmitir um sentimento que o
mundo nos sugere: a conquista espacial, a miséria do nordeste, nossas
recordações de infância.
Nossa sensibilidade foi motivada para a criação.
Mas, para que este sentimento se transforme em arte,
é necessário que ele passe do plano do irreal para o real, do inconsciente para
o consciente, da fragmentação de ideias para a seleção e organização, do
sentimento estético para a estética. Sentir, agir, pensar e organizar, são
constantes na criatividade.
A arte reúne aquilo que é latente em cada pessoa
humana, as informações que lhe chegam de fora através do meio social, ou dos
meios de comunicação. Aí incluímos teorias, escolas, artesanatos e também o conhecimento das técnicas
artísticas.
*Fotos da internet
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segunda-feira, 21 de janeiro de 2019
TRÊS MÚSICOS, TRÊS MENSAGENS
A casa do
Artur
É permeada
de música
São três
músicos
Com idades
Diferentes
Vivendo em
Mundos do
eterno
Imutável
Agora.
Acordo pela
manhã
Escutando
O som da
marimba.
O Artur está
de pé
Estudando
Celebrando
no
Compasso
Retirando
dos vidros
O ritmo da
vida
Que renasce
a
Cada
instante.
Da varanda
Da fazenda
Escuto o som
Da flauta do
Alexandre.
Música
erudita.
Os sons vão
mergulhando
Em outros
sons
Que vem das
estrelas
De mundos
superiores.
Dos sons da
natureza
Do canto dos
pássaros.
A música nos
Conduz.
Somos parte
do
Universo.
Somos Um com
A natureza.
A flauta vai
nos
Conduzindo
Para longe.
Ela mergulha
Nas fontes
E nos rios
Vai além dos
Mares , dos
ares
Para mundos
paralelos.
Regina me
convida
Para ouvir
Sua última
criação
Musical.
Música para
cura.
Ainda não
foi lançado
Mas já está
produzindo
O efeito
desejado.
A música
chegou do espaço
Em vários
momentos
Onde a terra
se une
Aos céus.
Escuta a
música
Da vida
Da grande
mãe
Que marca o
Compasso da
Existência.
Todos nós
sentimos a
Presença de
uma força
Superior
Conduzindo
estes sons!
*Fotos da
internet
VISITE
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segunda-feira, 14 de janeiro de 2019
EXPOSIÇÃO DE LÓTUS LOBO
Estamos na Galeria do Centro Cultural Minas Tênis
Clube, num salão de uma brancura deslumbrante, onde aos poucos vai surgindo a
mostra de Lótus Lobo, conhecida artista de Minas Gerais, gravadora e mestra da
Escola Guignard, onde deixou vários seguidores no campo da gravura.
Antes de entrar para o Atelier de Litografia de
Thais Helt, a Oficina 5, aprendi muito com a gravura de Lotus Lobo. A exposição
nos convida a pensar sobre nossos antepassados, produtores de pequenas
fazendas.
Lotus nos trouxe de Juiz de Fora, de uma fábrica
fechada, as pedras litográficas relegadas ao esquecimento e resgatadas por um
olhar de artista e pesquisadora.
Hoje, na arte contemporânea, os artistas são também
pesquisadores. Eles nos apresentam obras que não são realizadas apenas para
decorar paredes. Suas obras permitem a todos, momentos de reflexão.
Lotus redescobriu a mensagem escondida nas pedras
litográficas e, como gravadora, organizou uma série de quadros, painéis, tendo
como base os desenhos feitos em épocas anteriores. Ela nos conta a história do
nascimento da era industrial em Minas Gerais.
Os desenhos fazem lembrar a art-nouveau de
inspiração europeia, adaptados para uma divulgação muitas vezes ingênua, mas de grande valor publicitário.
Os pequenos fazendeiros de Minas Gerais, fabricantes
de uma manteiga de qualidade, chegaram a exportá-las para outros países em grandes latas com desenhos sugestivos.
Algumas latas vinham com nomes de mulheres: Odete, Juracy, Cidinha, Maria de
Lourdes, etc.
Percorrendo a exposição aprendi muito da história de
Minas, através dos fazendeiros que usaram a era industrial para mostrar ao mundo que Minas Gerais não é somente um estado de
riquezas extraídas da terra. Minas também produz um leite de qualidade, e é
deste leite, retirado de nossas vaquinhas que se fabricou manteiga vinda de
várias regiões, inclusive de Entre Rios de Minas. E os queijos, tão apreciados
por todos nós.
Saí da exposição motivada para visitar os pequenos
produtores do nosso queijo.
E não é preciso ir longe. Muito perto de mim, na
fazenda Luiziana, o Euler, meu filho, está se dedicando com o maior carinho a
esta produção. Decidi ir visita-lo no
local de trabalho para aprender um pouco com este artista que, de forma
modesta, sem grande publicidade, tem produzido um queijo artesanal que recebo
em minha casa semanalmente.
Parabéns à artista Lotus Lobo que, com sua exposição
de alto gabarito, foi nos conduzindo para dentro de nós mesmos, em nossas
terras, para aprender com os mais jovens um artesanato rural de grande valor
para nossa saúde.
Amanhã devo ir à fazenda e vou conhecer esta fábrica
de queijo que até hoje não pude visitar.
*Fotos de Ivana Andrés
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segunda-feira, 7 de janeiro de 2019
ARTE E CRIATIVIDADE II
A arte expressa o que o homem tem de pessoal, mas
também o que ele tem de universal. E é justamente dentro desta universalidade
que a comunicação se faz mais veemente, universalidade que não compreende
apenas uma geração, mas a totalidade de gerações presentes, passadas e futuras.
Por exemplo, não vivemos na Idade Média e no entanto
nos comovemos com as catedrais medievais. Não estamos no ciclo do ouro em Minas
Gerais, e até hoje a arte barroca nos sensibiliza.
A arte mexicana, a arte do Peru, feitas por índios
inteiramente desligados do contato com a civilização ocidental, despertam em
nós admiração por um passado glorioso, essencialmente criador.
Há, portanto, elementos universais na obra de arte,
que comunicam às outras gerações a linguagem artística.
Esta linguagem parte do subjetivo para o objetivo,
do particular para o universal.
Mesmo em nossa época de constante mecanização da
vida, ainda conservamos a liberdade de sentir e pensar individualmente, mesmo
que estes pensamentos não se ajustem às nossas ações.
Nos Estados Unidos, Andy Warhol usou propositalmente
processos mecânicos para se expressar. Evitou qualquer contato com a tela a ser
pintada. Dizia ele: “somos ensinados a pensar pelos meios de comunicação,
comemos os mesmos alimentos manufaturados, nossas roupas vêm em tamanhos
padrões, o individualismo desaparece cada vez mais.” E prossegue: “o motivo de
estar pintando dessa maneira é porque quero também ser como uma máquina, mas,
seria terrível se todos o mundo fosse igual”.
Mesmo Warhol, reconhecendo sua mecanização, a quer
individual. Seria realmente terrível se todo mundo as padronizasse . É
justamente a oposição dos contrários que totaliza uma civilização. Daí brotam novos caminhos, novas ideias.
Aos estímulos do meio, cada indivíduo reage a seu
modo. Vivemos numa mesma cidade, assistimos aos mesmos programas de TV, lemos
os mesmos jornais. Mas nossas reações diante do que nos é proposto de fora diferem
de acordo com nossa personalidade.
Quando sentimos e pensamos, somos livres, quando
agimos, nem sempre somos livres.
Para isso, basta lembrar que somos diferentes uns
dos outros, não só física, como psicologicamente. E é justamente atendendo a
estas diferenças individuais, que teremos sempre formas variadas de expressão
artística.
*Fotos da internet
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quarta-feira, 2 de janeiro de 2019
ARTE E CRIATIVIDADE I
A criatividade acha-se ligada ao processo de
percepção, pensamento e ação corporal, diz Herbert Read em seu livro “Arte e
Educação”.
Procurando refletir sobre estas palavras, teríamos a
arte como unificadora destes 3 elementos, como forma de equilíbrio do homem,
harmonizando aquilo que ele tem de individual com a natureza que o cerca, as
ideias e informações recebidas de fora, o comportamento da sociedade que o
rodeia, e nesta época das comunicações rápidas, também com o mundo em que ele
vive.
A criatividade é, portanto, forma de equilíbrio, de
harmonia, de modificação de comportamento humano.
A ausência de criatividade conduziria a civilização
ao caos. Imaginemos um mundo sem homens criadores. Não seria um mundo de
animais ou robôs mecanizados?
Das civilizações primitivas as mais avançadas, os
homens reagem aos estímulos que lhes veem do meio, criando no campo da ciência,
da arte e da filosofia, procurando edificar, construir, progredir.
Na poesia eles se expressam através da palavra; na
música combinam sons, na dança procuram o ritmo e a expressão corporal. Criam
formas novas na arquitetura, escultura, desenho, gravura, enxergam ângulos
diferentes na fotografia.
Criar, na esfera da arte, é portanto acumular
percepções, sensações, vivências, e organizá-las de determinada maneira.
O homem cria porque sente necessidade de expressão,
de comunicação.
Além de unificar as emoções humanas, a criatividade
é também portadora de uma mensagem, de um sentido. A mensagem da arte
concretiza-se no espaço e perpetua-se no tempo. A comunicação artística não é
feita, portanto, para ser consumida imediatamente, como a propaganda.
O que interessa à propaganda é a mensagem para o
momento. Mas se esta propaganda for artística, alcançará outros momentos no
futuro.
Temos como exemplo os cartazes de Toulouse Lautrec,
os anúncios das peças de Sarah Bernhard. Através de elementos artísticos que
eles contêm, sua mensagem nos vem do passado e nos alcança no presente.
*Fotos da internet
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segunda-feira, 17 de dezembro de 2018
A FLAUTA DE ALEXANDRE
Seguimos
Pela estrada
Mandando
Mensagens
Telepáticas
Para os carros
Andarem
Mais rápido.
Chovia devagarinho
Molhando os vidros
Do carro.
Em nossa frente
Uma fileira
De luzes
Vermelhas acesas
Dentro da neblina.
Chegamos com
Algum atraso na
Universidade.
Ali estava
Meu neto
Alexandre
No meio do
Palco.
Tocando uma peça
De Mozart.
Me lembro do
Alexandre
Aos doze anos.
Tocando Mozart
Junto com Artur
Seu pai.
Foi na casa de
Marília
No meu aniversário.
Empolgou a plateia
Com sua flauta
Em duo com o
Pai.
Os dois me acompanham
Nas exposições
E nos grandes eventos
De minha vida.
Sempre a flauta
Elevando as vibrações
Para o alto
Como um gorjeio
De pássaros.
No momento
Alexandre
Está sozinho
No palco circular
Da Universidade.
O concerto é uma
Prova de doutorado.
Foi realmente emocionante
Sentir o neto
Trazendo energia positiva
Para a plateia.
E se preparando
Para ser doutor...
*Fotos de arquivo
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segunda-feira, 10 de dezembro de 2018
ARTE NO COTIDIANO
Na zona rural, o aproveitamento de objetos para
outra finalidade é comum. Assim, uma banheira daquelas antigas, pode se
transformar em bebedouro para o gado. Já vi muitas vacas bebendo água nas
banheiras e fiquei pensando: as madames de antigamente já tomaram seus banhos,
depois as banheiras caíram em desuso, agora estão matando a sede das vacas.
Uma das características mais positivas da arte
contemporânea é a sua profunda ligação com o cotidiano e com a vida.
É o mundo interno do ser humano que precisa vir à
tona e ser conscientizado.
No Oriente esta conscientização é feita através da
meditação e do autoconhecimento.
No Ocidente a ação criadora das artes promove a
abertura de consciência e o crescimento interno.
A inteligência emocional se expressa de forma
espontânea, nas obras de arte ligadas à emoção – expressionismo, fovismo,
abstracionismo, ora lírico, ora informal e violento, trágico ou pessimista.
A inteligência mental se organiza nas composições
concretistas, construtivistas, cubistas, etc.
Foi necessário um esvaziamento de todas as
tendências para que a arte chegasse até o cotidiano.
Foi preciso a dessacralização dos ícones e a quebra
do mito do artista.
Para descer ao cotidiano, a arte teve de abrir mão
do seu caráter elitista.
Qualquer objeto, por mais vulgar que seja, tem a sua
própria dignidade e nas mãos do artista pode ganhar novas formas.
Escutei o depoimento de uma professora: meus alunos
ficaram radiantes diante de uma exposição contemporânea. “Podemos criar com
latinhas, caixotes, isso nós temos em casa...”
Hélio Oiticica uniu sua energia de criatividade a um
bloco carnavalesco.
Quando a arte se dessacraliza e se confunde com a
vida, já não pode mais ser analisada nos termos tradicionais de arte, ela é a
própria vida se manifestando.
*Fotos da internet
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segunda-feira, 26 de novembro de 2018
MINHA PARTICIPAÇÃO NO CONSTRUTIVISMO BRASILEIRO
Pediram-me para fazer uma palestra no CCBB de Belo
Horizonte sobre a minha participação no movimento construtivista brasileiro,
como representante de Minas Gerais. O texto abaixo é uma síntese de todos os meus
artigos já publicados sobre o assunto.
“A
exposição Construções sensíveis: A
experiência geométrica Latino-Americana na coleção ELLA FONTANAIS-CISNEROS, traz
ao Brasil um recorte da abstração em nosso continente. Junto ao importante
legado do concretismo e neoconcretismo brasileiros, são apresentadas as
poéticas abstratas que prosperaram em outros países a partir dos anos
1930.”(Extraído do catálogo da exposição Construções
Sensíveis, no CCBB de Belo Horizonte)
Percorro uma exposição que nos remete ao passado, ao
Construtivismo que percorreu o mundo e
veio nos mostrar o quanto somos irmãos. Realmente, somos parecidos, mesmo que
não tenhamos tido a oportunidade de um encontro pessoal. Existe o encontro
espiritual, encontro de sensibilidades semelhantes. O construtivismo vai nos
mostrando a identidade dos artistas. Ele
veio da Europa e encontrou na América Latina seus irmãos espirituais.
Os construtivistas europeus vieram da Rússia,
desceram até a Alemanha e a França, e, por motivo de guerra, chegaram às
Américas.
Os Estados Unidos acolheu os imigrantes artistas, tais como
Mondrian. Ali ele se redescobriu, ficou
famoso.
A Argentina e o Uruguai receberam a mensagem
construtiva, através da arte e do pensamento de Torres Garcia e Maldonado. Torres
Garcia buscava o espiritual na arte e a
redescoberta dos povos primitivos das Américas.
O Brasil tornou-se o grande difusor das ideias
construtivas. No nosso solo floresceram artistas plásticos, poetas, críticos,
tendo a Bienal de São Paulo como a grande difusora.
O construtivismo chegou até as montanhas de Minas e
ali encontrou jovens artistas que aderiram ao movimento.
Fiz parte deste movimento.
O Construtivismo
na década de 50, nos propunha disciplina, concentração, limpeza de cores, uma
arte mental, intimista, sem impulsos emocionais. Cultivava-se a virtude da
paciência. Os quadros levavam meses para serem feitos e o instrumento usado na
época para se conseguir uma linha perfeita era uma espécie de caneta ou
bisturi, chamado tira-linhas, instrumento gráfico em desuso hoje em dia, na era
do computador. Com as linhas paralelas eu fazia postes de luz e partituras
musicais. Gostava de ficar horas pintando, porque me fazia bem à alma.
Passar pelo
construtivismo foi para mim uma lição de vida. O fazer artístico significava
crescimento. A integração de varias áreas das artes, necessária a uma revisão
de valores, era um dos pontos mais importantes do movimento construtivista que
surgiu a partir da primeira Bienal de São Paulo. Poetas, músicos e pintores se
uniam dentro do mesmo ideal estético dando prioridade à pureza da forma. O
grande incentivador do construtivismo foi o crítico de arte Mário Pedrosa, que
visitava os artistas em seus ateliês e muitas vezes chegava até Minas Gerais
para acompanhar o trabalho dos artistas mineiros que buscavam uma arte pura,
desligada dos padrões figurativos. Os júris de seleção das primeiras Bienais,
que às vezes eliminavam 90% dos trabalhos apresentados, eram o grande teste a
ser enfrentado. Naquele tempo não existiam curadores de arte e os artistas se
dispunham a passar por essa experiência.
A aprovação na Bienal era a minha chance de
descer das montanhas e viajar para São Paulo, encontrar os amigos companheiros
de jornada, participar dos eventos internacionais e estudar o pensamento dos
grandes artistas abstratos europeus. Trocava ideias com os paulistas Maria
Leontina, Milton Dacosta, Arcângelo Ianelli e Volpi. Todos tínhamos vindo de
antecedentes figurativos e isto transparecia em nossos trabalhos. Não havia a
preocupação matemática dos concretistas suíços, seguíamos o comando da
sensibilidade e da intuição. Naquela ocasião as ideias espiritualistas de
Kandinsky começaram a me acenar como uma estrela luminosa. Os grandes pintores
abstratos europeus, principalmente os da vanguarda russa, não se limitavam aos
aspectos formais; tinham uma busca interior, um contato direto com níveis mais
profundos de consciência.
O rompimento com a figura e o tema indicaram
também direções novas para a escultura brasileira. A exposição do artista suíço
Max Bill no Museu de Arte de São Paulo em 1950, impulsionou a nova geração de
escultores ao questionamento dos moldes tradicionais da escultura figurativa,
para abraçar a forma tridimensional pura. Do grupo de Minas, três artistas
escultores aderiram ao movimento: Amílcar de Castro, Franz Weissmann e Mary
Vieira. Mais tarde, Mary deixou o Brasil para se radicar na Suíça, onde se
tornou uma aluna e seguidora de Max Bill vindo a ser uma artista de renome
internacional.
Repensar
o construtivismo é também repensar os
caminhos por onde passamos. Aqui em Minas Gerais a nossa visão da arte vinha
dos antecedentes líricos de Guignard. Um pequeno grupo se reunia no ateliê de
Marília Gianetti, projetado pelo arquiteto Sylvio de Vasconcellos. Marília
Gianetti, Mário Silésio, Nely Frade e eu formávamos o grupo de pintores que na
década de 50 encontraram o seu próprio caminho dentro da arte não figurativa.
No
Museu do Índio, no Rio de Janeiro, procurei observar com atenção os caracteres
geometrizados em todo artesanato indígena, nas cestarias, cerâmicas e até na
pintura corpórea. Muito antes da chegada dos europeus, mergulhados nas
florestas, seguindo o ritmo natural da vida, os índios buscavam o equilíbrio
também em suas manifestações artísticas.
Observavam a pele dos
animais, onças, lagartas e dali partiam para a busca da ordem e da simetria em
seus padrões geométricos.
Nossos antepassados se
manifestavam de forma construtiva, um construtivismo orgânico e espontâneo.
O construtivismo brasileiro também buscou
alcançar este equilíbrio e ordem. O movimento construtivista que se propagou
pelo Brasil na década de 50 foi uma
integração perfeita do que veio da
Europa com o que já existia dentro de nós.
O construtivismo sensível não acaba nunca, porque
ele é o mensageiro de uma paz que existe dentro de todos nós.
Esta paz, os artistas buscaram por meio de obras de
grande beleza e serenidade.
O desejo de paz veio à tona numa época de grandes
guerras.
Duas grandes guerras na Europa, várias ditaduras
pelo mundo.
Todos passaram para a história, os artistas
morreram, mas sua arte continua viva, trazendo até nós o desejo da paz que os
inspirou.
O construtivismo é uma meditação.
Mergulhados no silêncio de sua própria interioridade
os artistas transcenderam a violência e a opressão.
Percorrendo as salas desta exposição vou sentindo
cada vez mais o poder da arte de transmutar energias. Revejo os Bichos
de Lygia Clark, os Metaesquemas de
Hélio Oiticica, as telas construtivas de Volpi e Ivan Serpa, os objetos de Ana
Maria Maiolino e Mira Schendel.
Caminhar pela exposição é encontrar as origens, a
expansão e o sentido deste movimento que percorreu o Brasil na década de 1950.
No momento, todo o meu trabalho está inspirado no
que eu fiz nos anos 50. Os meus desenhos construtivistas da década de 50 foram
tridimensionados com a ajuda de minha neta Elena Andrés Valle, transformando-se
em esculturas de aço. Recentemente, retomei o construtivismo de uma forma mais
espontânea, através de uma série de colagens.
*Fotos de arquivo
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segunda-feira, 19 de novembro de 2018
CELSO RENATO, 100 ANOS
A série de pinturas construtivas de Celso Renato, no
momento em exposição na Grande Galeria do Palácio das Artes marcou a sua
presença definitiva no cenário das artes plásticas de Minas e do Brasil.
Percorrendo a mostra, reproduzo aqui trechos dos depoimentos de Claudia
Renault, Marcio Sampaio e Amílcar de Castro, amigos do artista e admiradores de
sua obra.
“Celso
aparece nos anos 60, no cenário das artes de Belo Horizonte, já como um homem
maduro, com uma pintura expressionista, com traços fortes e largos. A ideia é
de um sujeito à procura de si, da sua alma, na maneira mais íntima de se
expressar.
É nesse momento que as coisas do mundo começam a
conversar com ele. Celso parece escutar o silêncio e outros materiais que não a
tela. Nessa hora ele revela a sacralidade das coisas mais rudes. É com um gesto
mínimo, certeiro, de quem lança uma seta, que Celso Renato inicia suas
intervenções nas madeiras – restos de materiais de construção civil. Uma vez
que o material utilizado já carrega em si texturas, falhas, pregos, Celso
inclui esses materiais e cria uma relação muito especial entre sua proposta
geométrica e a organicidade do suporte. É nesses tapumes que o artista enfatiza
as formas e revela a sacralidade e a verdadeira alma das coisas. Nessa hora
lembro-me de Manoel de Barros ao dizer que as “coisas sem importância são bens
de poesia”. Celso Renato me ensinou isso antes de Manoel. Ele retira do refugo
da madeira e trava com ela um diálogo. Nesse diálogo amoroso com a matéria, dá
vida ao que já estava perdido.
É com suas interferências com a madeira que Celso
marca presença nas artes plásticas do Brasil e do mundo. Estabelece uma
conversa com deuses e ancestrais. Formas e cores puras que nos remetem a
rituais, conversas veladas com povos que fazem arte com verdade, como religião,
como necessidade de registro da existência.” (CLAUDIA RENAULT, curadora)
“O trabalho atual de Celso Renato parte dessa
experiência, desse diálogo com a matéria. Sua arte só é possível na medida em
que a matéria respondeu a seu apelo e se entregou totalmente para que a mão a detenhe
e a transforme.. O suporte é a madeira que ele encontra nas construções – já
usada, recosturada, escarificada pelo uso e condenada à deterioração – e que o
artista recupera , modificando-a com traços, formas pintadas, sempre seguindo
as sugestões que lhe trazem as erupções naturais e os acidentes sofridos antes
pela própria matéria.” (MARCIO SAMPAIO)
“É madeira de construção
Cheia de sinais, riscos e ranhuras
Frinchas, frestas, buracos e rachaduras
São algumas tábuas juntas a martelo
Com pregos aparentes
Às vezes aparecem pedaços como tramelas
Tramelas de portas que não se abrirão jamais.
Como se guardando imenso segredo perdido
Segredo agora revelado
E que mostra o caminho dia
Da noite
Do sol esquecido
Que volta a nos envolver
Na música de tambores longínquos” (AMILCAR DE CASTRO)
Fotos de Ivana Andrés
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segunda-feira, 5 de novembro de 2018
ARTE NA CONTRA CULTURA II
Dou continuidade ao artigo "Fluxus", que escrevi para o jornal "O Estado de Minas".
“Fluxus”
pode ser considerado exemplo da busca do humanismo na arte. Segundo a
apresentação da exposição, “Fluxus”
nasceu em 1961, a partir da liderança do lituano George Maciunas, tendo como
origem a rejeição aos valores que cercavam as “artes eruditas” e o caráter
comercial que dominou o mercado internacional de arte após o fim da Segunda
Guerra Mundial. “Fluxus” foi o último
grande movimento coletivo de artistas em torno de ideias de transformação da
cultura e da sociedade. Maciunas dinamizou o movimento de contracultura,
valorizando a criatividade que existe em qualquer ser humano.
O descondicionamento de
receitas e fórmulas que aprisionam a arte e a mudança dos valores tradicionais
permitiram que aquele movimento se estendesse às pessoas comuns, sem qualquer
ligação com críticos, marchands ou professores de arte. Maciunas escreveu um
manifesto verificando no dicionário o significado da palavra “fluxo”
selecionando todas as definições que tinham conotações de mudança, purificação,
fluidez e fusão.
Participaram daquele
movimento artistas como Yoko Ono, George Brecht, John Lennon, Roberts Morris,
Joseph Beys e vários outros, que integraram festivais, debates e exposições.
A mensagem de “Fluxus” ultrapassou as fronteiras da
Europa.
Havia no mundo a
necessidade de protestar contra o consumismo, o imperialismo e as guerras,
contra o massacre de inocentes e o crime organizado em forma de poder.
Quem contempla a
exposição pode sentir a denúncia explícita dos grandes criminosos de guerra do
nosso tempo, sedentos de expansão. George Maciunas lançou sua denúncia contra a
violência, os massacres realizados pelos nazistas na Europa, o genocídio dos
índios americanos pelos espanhóis e o sofrimento da população civil na guerra
do Vietnã.
Ao mesmo tempo que
denunciou a opressão como impressionante bandeira da morte, também levantou a
bandeira da paz, com o incentivo ao budismo zen e às práticas de meditação. A
meditação busca o ser interno e a intuição que está além da mente fragmentada.
O budismo zen não é uma religião, mas incentiva um modo de viver criativo e
espontâneo. Chegando aos EUA na década de 60, as práticas de meditação ganharam
adeptos em vários artistas da Action Painting ou expressionismo abstrato e nos
jovens que largaram o conforto das famílias, o consumismo e os bens materiais
para viverem em comunidade.
Os Beatles trouxeram da
Índia práticas de meditação e, através da música, divulgaram sua mensagem de
“paz e amor”. Era necessário vivenciar o “agora”, o eterno presente”, e saber
viver de forma simples e despojada.
A importância dos
movimentos de contracultura está no fato de que eles promovem mudanças no
comportamento passivo da sociedade, abrem indagações, despertam novos
horizontes.
“Fluxus”
me fez refletir mais uma vez sobre a capacidade intuitiva dos movimentos
artísticos que, movidos por um impulso energético universal, buscam a
libertação da violência e a harmonia planetária.
*Fotos da internet
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