segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017


REDESCOBERTA DO EU INTERIOR

O mundo moderno, preocupado com o consumo, o lucro e a competição, envolve-se na fumaça das glórias externas, esquecendo-se da realidade interna, cuja existência muitas vezes não chega a vislumbrar. O raciocínio lógico impede a abertura para a intuição. A meditação, a interiorização, a arte, conduzem-nos a esta limiar de luz, e, portanto, trazem consigo a paz interior.

A arte é uma das formas mais penetrantes de redescoberta deste Eu interior, que todo homem possui, mas, muitas vezes, não chega a perceber. Os artistas têm espontaneamente a tendência de abrir a porta da intuição e deixar que o Eu interno fale: seja na combinação de cores, de sons ou de palavras. Esta abertura para a intuição coloca-os de certo modo em atitude receptiva, deixando fluir o que estava adormecido no inconsciente.

A intuição ilumina a mente durante o curso do trabalho, ou chega de surpresa, muitas vezes de madrugada, quando tudo dorme. A maior riqueza do artista é o diálogo silencioso que trava consigo mesmo, superando os dias de sucesso ou de fracasso. Este diálogo significa para ele forma de purificação e equilíbrio. Muitos artistas conseguiram este equilíbrio e chegaram a testemunhá-lo em seus depoimentos. Mas, para isto, tiveram de se manter na indiferença às solicitações e pressões externas, aos acenos do lucro, da ambição e das glórias. Os prêmios e o reconhecimento público são importantes na medida em que colaboram para o incentivo e o aumento da criatividade. A criatividade é a chama que deve se manter acesa, em contato permanente com a vida interior.

Mas este encontro com o Eu interior não é privilégio dos artistas, todo ser humano é um criador em potencial, portanto nasceu com a predisposição para entrar em contato com a realidade interna, chave de sua integração. O trabalho feito com amor, colabora nesta integração. O homem que segue suas tendências naturais, que se desenvolve dentro da profissão para a qual foi chamado, está colaborando de certo modo para o seu próprio equilíbrio e para o equilíbrio daqueles que o cercam. Sentir-se integrado naquilo que se faz, é fator importantíssimo não só para o rendimento do trabalho, como para o desenvolvimento e progresso do meio em que se vive. O trabalho feito em ressonância com a vocação de cada um, do cozinheiro ao sapateiro, do camponês ao industrial, do médico ao engenheiro, da dona de casa à modista, ajuda na reconstrução da pessoa humana equilibrando suas energias internas e externas. Muitas vezes nos entregamos a tarefas que não gostamos, julgando ser este o nosso dever, não reservando um só momento para o desenvolvimento de nossa vocação. Esquecemo-nos de que ela nos foi dada por Deus para ser desenvolvida, e não reprimida. Por meio dela seremos livres. Desenvolver a própria vocação não é forma de egoísmo, mas procura de totalidade.

Nesta época de massificação e desajuste social, é necessário compreender que as energias do homem precisam se integrar, crescendo em harmonia com suas aspirações, de acordo com suas tendências naturais. Esta integração virá beneficiar o progresso do homem como pessoa, refletindo-se em seu ambiente. O despertar das energias interiores através do desenvolvimento das inclinações individuais se dará no trabalho, no esporte, na arte, no estudo ou na reflexão.

*Fotos  de arquivo e da internet


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terça-feira, 7 de fevereiro de 2017


GUARDANAPOS DE CARLOS STARLING

“Guardanapos” é o título do livro de Carlos Starling , escrito ao sabor do momento, nas mesas, nos jantares, nos encontros com amigos. Carlos Starling é médico infectologista, especialista em Medicina Preventiva e Social, mestre e professor de Medicina, poeta, escritor, gourmet e ciclista.

Logo de cara, me simpatizei com o livro, pois também escrevo em   qualquer papel  que estiver  à minha frente. Somos escritores repentistas, do momento. Guardanapos, escrito em guardanapos, é um depoimento sensível das vivências de um médico, cientista, escritor, pai de família. Nada escapa à sua visão da vida, o mundo externo provocando palavras, rimas poéticas.

O dia a dia de um poeta é registrado no seu cotidiano, no trem que passa, nas filhas brincando, nas vivências íntimas de um médico escritor...

Aliás, por que os médicos, de um modo geral, gostam tanto de arte?
Meu marido, Luiz Andrés, não escrevia poemas, mas apreciava a arte, enxergava o futuro de seus familiares artistas, dava incentivo e preparava para mim telas enormes...
Fico pensando no quanto devo a ele o incentivo e coragem para seguir em frente. Ele me dizia sempre:
“Artista não pode ficar parado aqui em Belo Horizonte, tem de conhecer outros lugares. E com este incentivo tive coragem de me aventurar pelo mundo...

Mas, voltemos ao nosso amigo Carlos, casado com minha neta Joana.
Agora tenho nas mãos o seu livro e volto a refletir sobre o médico poeta.
A medicina é também uma arte, a arte de cuidar do ser humano, tornar mais leve o seu sofrimento, curá-lo.

No momento, tendo Joana ao seu lado, Carlos pesquisa sobre o papel que está em sua frente, no restaurante, enquanto espera o almoço chegar.
É ali, naquele momento, que a poesia vem à tona em sua intensidade. Quantos guardanapos seriam necessários para um poema intensivo como “Síria”?
Da sua coletânea este poema é o que mais nos toca no momento em que a Síria está sendo destruída e arrasada pela ira dos canhões.
O problema dos refugiados, da Síria destruída ali está registrado de forma poética.
   
“Guardanapos” é uma coletânea de 26 poemas de centenas escritos por Carlos. O livro foi idealizado e produzido por sua esposa Joana Caporali Andrés Starling. Produzido secretamente, o livro foi um presente de aniversário de Joana para Carlos, e apresenta um pequeno recorte de décadas de escrita.

SÍRIA

Fujo para a vida,
Lanço minha sorte ao mar.
Deixo meu quintal,
Meu parreiral,
Meus lírios que não floriram.  

Ondas levam meus sonhos,
Meus filhos,
Meus álbuns de família. 

Ancoro num deserto de farta solidão,
Sou um número,
Uma onda dissonante,
Uma imagem repetida.
Abro os olhos do mundo
Para o futuro incerto...
Amor é o que espero,
Vida é o que quero,
Apenas vida.

Síria, Síria,
Minha Síria,
Otomana, desértica,
Minha Síria, Assíria, Curda, Turca,
Minha Síria Grega, Armena,
Minha Síria Druza,
Sunita,  Alaudita...
Bendita
Minha Síria Yasidi,
Árabe e Cristã.
Minha Síria tiranizada,
Arrasada pela ira dos canhões insensatos...
Minha Síria milenar,
Romana,
Francesa,
Levante,
Levante...
Abrace seus filhos com carinho.

Minha Síria plural,
Plana, Fertil,
Eufrates.
Onde foram seus filhos?!
Abrace-os, abrace-os...
Minha Síria Damasco,
Alepo,
Latakla,
Hama,
Ama teus filhos,
Para onde foram teus filhos?!
Abrace-os...
Levante...
Levante...

Minha Síria de Bana Alabed,
De Bana e Fatermah
Pede paz,
Paz é o que pede Bana Alabed...
Paz  Levante.
Levante paz...

(Novembro de 2016) 
  
*Fotos de arquivo


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