segunda-feira, 30 de julho de 2018


PINTURA MODERNA BRASILEIRA I


Nosso estudo em linhas gerais do panorama estético universal, partindo das primeiras correntes artísticas modernas até a atualidade, trouxe-nos também considerações sobre a atual pintura brasileira.
         Não é nossa intenção estudar pormenores da evolução da arte moderna em nossa terra, mas apenas fazer notar sinteticamente os fatores principais de sua transformação no tempo, ligando-a de maneira definitiva à arte universal.
         A arte contemporânea desconhece fronteiras e sua ligação com outras terras se faz não por modismo, mas pela consciência que o artista moderno tem de pertencer à humanidade e a ela estar ligado indissoluvelmente.
         A contribuição brasileira à arte universal já se faz sentir, não só através de nossa arquitetura, conhecida e admirada no mundo inteiro, como também através de nossa escultura, pintura, gravura e desenho. Dão testemunho disso os prêmios conferidos a nossos artistas nas exposições bienais de Veneza e de Paris.
         A alma de nosso povo, com suas lutas para um desenvolvimento social, seu desejo de afirmação e progresso, está expressa na mensagem que nossos artistas levam a outros povos e raças.
         As características próprias de nossa pintura se determinam através de elementos puramente plásticos, que formam o denominador comum de nosso país e de nossa cultura. São formas às vezes ligadas ao barroco ou às tradições populares, condicionadas ao nosso clima, ao colorido de nosso céu e à exuberância de nossa vegetação.
         Vivemos cercados de cores e por contradição nos expressamos tão bem em preto e branco: depois da arquitetura, foi a gravura brasileira que despertou maior interesse nos meios internacionais.
         A revisão histórica da arte moderna no Brasil poderia ser estabelecida em três períodos distintos, que determinaram as principais direções de nossas tendências artísticas. (Trecho de meu livro “Vivência e Arte”, Editora Agir, 1966)

Atualmente, está havendo na Europa, uma busca das experiências artísticas feitas no Brasil nos anos de 1950 e 60. Este interesse foi motivado por vários fatores, entre eles uma retrospectiva da Arte Construtiva Brasileira da Coleção Adolpho Leirner, adquirida pelo Museu de Houston, nos EUA, sob a curadoria de Mari Carmem Ramirez. Esta coleção foi exposta na Europa com grande sucesso.

*Fotos de Maria Helena Andrés e de arquivo

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segunda-feira, 23 de julho de 2018


PINTURA MODERNA XIII



       As obras de arte que não são autênticas desaparecem com o correr dos anos. Às vezes, por equívocos de seus contemporâneos, conseguem impor-se e mesmo ganhar sucesso perante o público e a crítica. Podem ser laureadas e até pertencer a museus. Mas não resistem ao tempo que passa e lhes desnuda a fragilidade. 

         Assim, mais tarde, submetidas ao julgamento das gerações que se sucedem, o verdadeiro lugar lhes é concedido.

         Modigliani terminou seus dias pobre e doente, Van Gogh não conseguiu vender um único quadro e Cezanne não conheceu em vida a glória que por direito mereceu mais tarde. Tiveram apenas, a seu favor, a autenticidade de sua arte e a força do seu gênio criador.

         São estes, e muitos outros, os exemplos que o artista não deve esquecer. E as palavras de Kandinsky, um dos inovadores da pintura abstrata, confirmam: "Não se pode qualificar de bem pintado o quadro de valores exatos; estes inevitáveis valores de que falam os franceses, ou o quadro dividido quase cientificamente em quente e frio; mas sim aquele que possui uma vida interior total."

         A crise espiritual do mundo moderno, a valorização da matéria sobre o espírito, não impedem o artista de procurar sempre o fundamento de sua arte, no seu mundo interior. E o fato de viver submetido à mecanização do século XXI não o impede de continuar a se manifestar também de um modo individual, acrescentando o seu impulso interior às experiências mais modernas e avançadas da pintura.

         Não existe ainda o recuo do tempo para se afirmar qual a maior contribuição que foi dada à arte moderna.

         E a evolução da arte vai se constituindo de heranças sucessivas, neste eterno caminhar em busca da beleza. (Trecho do meu livro “Vivência e Arte”, editora Agir, 1966)

*Fotos da internet

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quinta-feira, 19 de julho de 2018


PINTURA MODERNA XII


"As comunicações modernas, velozes como a luz, reduziram a quase zero o tempo entre as ações dos homens e suas consequências. Um tiro disparado em Berlim pode fazer explodir o mundo em poucos minutos. Um equilibrista pode tombar do arame num circo de Moscou e sua morte ser vista em Londres ou Nova Iorque." (Morris West)

         Também na arte, o tempo e a distância se reduzem e uma obra consagrada nas Bienais de Veneza, São Paulo ou Paris pode ser imediatamente conhecida, valorizada e criticada pelo mundo inteiro.

         É por isso que a pintura de hoje é mais universal. Este contato com as ideias universais torna o artista moderno precocemente erudito. São revistas e livros com reproduções coloridas das obras dos grandes mestres, são conferências e exposições coletivas. O artista traz realmente, dentro de si, um museu imaginário.

         No Brasil, a Bienal de São Paulo veio trazer a milhares de brasileiros a possibilidade de conhecer de perto os grandes nomes da pintura mundial. Obras até então desconhecidas ou conhecidas por informação, puderam ser admiradas no original, confrontadas e estudadas em seus mínimos detalhes. Novas técnicas começaram a ser usadas e a experiência européia foi também introduzida em nossa terra.

         A história da arte moderna continua e continuará a ser soma de experiências. As correntes se sucedem e se destroem, mas, mesmo se destruindo, completam-se.
         Essas correntes surgem espontâneas, como uma inevitável continuidade de todo trabalho criador. E também, naturalmente, perdem a sua razão de ser quando a sinceridade das primeiras descobertas dão lugar à fórmula e à repetição, sem originalidade, das idéias alheias.

         Não se pode impor, de fora, determinada forma de arte e exigir a cega adesão de todos os artistas. Não são as correntes que fazem o artista, mas sim a autenticidade com que ele se expressa. Quando surge uma nova idéia, as outras, ilusoriamente, parecem superadas.

         Esquece-se de que a fertilidade de imaginação do artista não conhece os limites vindos de fora; sua sede de criar e de se expressar independe de estar ou não ligado às últimas idéias da vanguarda. Às vezes, sua experiência o conduz a caminhos diferentes, que influem também na conquista de novas e sérias descobertas.

         Basta que ele tenha algo de novo a dizer dentro de determinada maneira, seja ela figurativa, abstrata, concreta, informal, etc. A arte é a mais evidente afirmação da liberdade humana e, por isto mesmo, é um desafio ao julgamento restrito de sua época. Ela se impõe, quando é autêntica, pela própria força desta autenticidade, mesmo que os contemporâneos não lhe dêem atenção. (Trecho do meu livro “Vivência e Arte”, editora Agir, 1966)

*Fotos da internet

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segunda-feira, 9 de julho de 2018


HOMENAGEM À MARIA HELENA ANDRÉS - SEMINÁRIO ARTE CONCRETA E VERTENTES CONSTRUTIVAS


No dia 26 de junho de 2018, foi aberto um seminário sobre Arte Concreta e Vertentes Construtivas, que me homenageou como uma das participantes daquele movimento ocorrido no Brasil na década de 50. Foram também homenageados  a historiadora Aracy Amaral e o artista e crítico de arte  Márcio Sampaio. Abaixo, transcrevo a minha palestra no evento. 

“É para mim uma honra estar aqui presente neste importante seminário.
Agradeço, de coração, a homenagem que me está sendo prestada, agradeço aos críticos, artistas e pesquisadores que organizaram este seminário.

Considero da maior importância um estudo aprofundado do construtivismo brasileiro da década de 50. Como artista mineira, atuante na época, posso dar o testemunho da minha própria experiência.

O construtivismo foi importantíssimo para todos nós que abraçamos as ideias vanguardistas daquela época. Para mim ele foi como uma semente que mais tarde se reproduziu em outras formas de expressão. Devo à minha experiência construtiva dos anos 50 a fase atual de esculturas e colagens. Foi a retomada da ordem construtiva, depois de muitos anos de liberdade da fase gestual.

Para este seminário procurei selecionar textos escritos para o meu blog e retirados dos meus dois livros: Vivência e Arte e Os Caminhos da Arte.
A exposição Ordem &Liberdade, sobre a arte abstrata nas coleções do MAM e de Gilberto Chateaubriand, inaugurada no final de 2003 no Museu de Arte Moderna do Rio, tendo como curador o crítico Fernando Cocchiarale, propunha uma retomada histórica do abstracionismo no Brasil, com ênfase nos anos 50. Naquela exposição eu estava do lado correspondente à ordem, à disciplina. Foi com emoção que pude rever os artistas da década de 50 que participavam das bienais de São Paulo. Lá estavam, ao meu lado, vizinhos do mesmo painel, os companheiros de arte da época, muitos já falecidos: Milton Dacosta, Maria Leontina, Mário Silésio, Alfredo Volpi, Amilcar de Castro e Lygia Clark, entre outros. Senti-me a própria sobrevivente percorrendo a mostra.

O concretismo na década de 50 nos propunha disciplina, concentração, limpeza de cores, uma arte mental, intimista, sem impulsos emocionais. Cultivava-se a virtude da paciência. Os quadros levavam muito tempo para serem feitos e o instrumento usado na época para se conseguir uma linha perfeita era uma espécie de caneta ou bisturi, chamado tira-linhas, instrumento gráfico, em desuso hoje em dia, na era do computador. Com as linhas paralelas eu fazia postes de luz e partituras musicais. Gostava de ficar horas pintando, porque me fazia bem à alma.

Passar pelo concretismo foi para mim uma lição de vida. O fazer artístico significava crescimento. A integração de várias áreas das artes, necessária a uma revisão de valores, era um dos pontos mais importantes do movimento concretista a partir da primeira Bienal de São Paulo. Poetas, músicos, pintores e escultores se uniam dentro do mesmo ideal estético, dando prioridade à pureza da forma. O grande incentivador do concretismo foi o crítico Mário Pedrosa, que visitava os artistas em seus ateliês e, muitas vezes, chegava até Minas Gerais, para acompanhar os trabalhos dos artistas mineiros que buscavam uma arte pura, desligada dos padrões figurativos. Os júris de seleção das primeiras bienais, que às vezes eliminavam 90% dos trabalhos apresentados, eram o grande teste a ser enfrentado. Naquele tempo não existiam curadores e os artistas se dispunham a passar por essa experiência de júris nos salões e bienais.

A aprovação nas bienais era a minha chance de descer das montanhas e viajar para São Paulo, encontrar os amigos, companheiros de jornada, participar dos eventos internacionais, ter um contato direto com as obras de arte e estudar o pensamento dos grandes artistas abstratos europeus e latino-americanos. Trocava ideias com os artistas de São Paulo: Maria Leontina, Milton Dacosta, Arcângelo Ianelli e Volpi. Para nós não havia a preocupação matemática dos concretistas suíços, seguíamos o comando da sensibilidade e da intuição. Naquela ocasião, as ideias espiritualistas de Kandinsky começaram a me acenar como uma estrela luminosa. Os grandes pintores abstratos europeus, principalmente os da vanguarda russa, não se limitavam aos aspectos formais. Buscavam a transcendência, o contato direto com os níveis mais profundos da consciência.

O rompimento com a figura e o tema indicaram também direções novas para a escultura brasileira. A exposição do artista suíço Max Bill, no Museu de Arte de São Paulo, em 1950, impulsionou a nova geração de escultores ao questionamento dos moldes tradicionais da escultura figurativa, para abraçar a forma tridimensional pura. Do grupo de Minas, três artistas escultores aderiram ao movimento: Amilcar de Castro, Franz Weissmann e Mary Vieira. Mais tarde, Mary deixou o Brasil para se radicar na Suiça, onde se tornou aluna e seguidora de Max Bill. Amilcar e Weissmann foram para o Rio de Janeiro e aderiram ao movimento neoconcreto.

Repensar o concretismo é também repensar os caminhos por onde passamos. Aqui em Minas Gerais a nossa visão da arte vinha dos antecedentes líricos de Guignard. Um pequeno grupo se reunia no ateliê de Marília Giannetti, projetado pelo arquiteto Sylvio de Vasconcellos. Marília Giannetti, Mário Silésio, Nelly Frade e eu formávamos o grupo de pintores que, na década de 50, encontrou o seu próprio caminho dentro da arte não figurativa. A mesma preocupação do simples estava em todos nós.

Revendo as obras do Museu de Arte Moderna do Rio cheguei à conclusão  que houve em todos nós um ponto de mutação comum: a necessidade de eliminar o supérfluo, reduzir o impulso emocional e buscar a essência na arte e na vida.
Naquela exposição foi-me possível constatar um fato: todos nós mudamos depois de algum tempo, alguns radicalmente, outros sem grandes saltos. O caminho da liberdade foi uma consequência do exercício da disciplina. Ali no Museu, frente a frente, estavam os opostos complementares de tudo que existe na natureza e na criação.

No momento em que a arte construtiva brasileira está sendo amplamente divulgada no exterior, convém lembrar também nossas origens indígenas.
“Eu nunca te encontraria se já não estiveste comigo”. Esta frase do escritor francês Antoine de Saint-Exupéry nos revela a força da tradição indígena brasileira, que aflorou na década de 50, conduzindo artistas, pintores, desenhistas, escultores, designers, arquitetos e poetas, para a busca da ordem e do equilíbrio na arte. Essa ordem interna sempre foi buscada pelos índios em todas as suas manifestações culturais que se estendiam para a vida da comunidade.

O movimento construtivo, que se propagou pelo Brasil na década de 50, foi uma integração perfeita do movimento vindo da Europa e da América Latina, com oque já existia nas nossas raízes culturais.
Muito obrigada!”

*Fotos de Fernanda Granato

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segunda-feira, 2 de julho de 2018


AUROVILLE E BRASÍLIA



Maurício Andrés Ribeiro, residente em Brasília, participou recentemente de um seminário, onde apresentou as semelhanças entre as cidades de Brasília e Auroville, “Cidade Aurora” na Índia, criada por Sri Aurobindo, um grande filósofo indiano. Transcrevo abaixo trechos de sua palestra.

“Auroville foi reconhecida em 1966 pela Assembleia Geral da UNESCO como cidade dedicada ao entendimento entre os povos e à paz.

Em minha intervenção, lembrei que a aurora traz a luz do amanhecer,  dissipa a escuridão e auxilia no despertar para o conhecimento e a sabedoria, seja em Auroville e Aurobindo, seja no discurso de Juscelino Kubitschek de Oliveira, em 2 de outubro de 1956. "Deste Planalto Central, desta solidão que em breve se transformará em cérebro das altas decisões nacionais, lanço os olhos mais uma vez sobre o amanhã do meu país e antevejo esta alvorada com fé inquebrantável em seu grande destino".

O amanhã, a evolução e o futuro da humanidade inspiraram Sri Aurobindo e Lúcio Costa, ambos com uma visão unificadora. Ambos apontam rumo ao futuro, numa visão evolucionista que considera o espírito como o motor da evolução.

Sir Aurobindo considera de modo integral a evolução da  matéria para a vida, para a mente e para a superconsciência, que ainda está por florescer nessa etapa de crise da evolução em que vivemos. Essa formulação tem afinidade com a teoria das resultantes convergentes de Lúcio Costa quando escreve que
“O desenvolvimento científico e tecnológico e a ecologia, inteligentemente confrontados, são sempre compatíveis. O desenvolvimento científico e tecnológico não se contrapõe à natureza, de que é, na verdade, a face oculta – com todas as suas potencialidades virtuais – revelada através do intelecto do homem, vale dizer, através da própria natureza no  seu estado de lucidez e de consciência. O homem é, então, o elo racional entre dois abismos, o micro e o macrocosmos, ambos fenômenos naturais, cujos produtos “elaborados” são a contrapartida do fenômeno natural “palpável”. O intelecto e a consciência do homem são a quintessência da natureza tomada como um todo.”

Brasília foi fundada em 1960 e tombada como patrimônio da humanidade em 1987. Brasília tem desde seu projeto inicial a marca da beleza. O senso ESTÉTICO está presente.  Falta evoluir em direção à verdade e à bondade, com a evolução de seu padrão ÉTICO.

Terminei minha fala lendo um poema de Abhay Kumar, diplomata e poeta indiano que cita o sonho do visionário Dom Bosco “Entre os graus 15 e 20 havia uma enseada bastante longa e bastante larga, que partia de um ponto onde se formava um lago. Disse então uma voz repetidamente: -Quando se vierem a escavar as minas escondidas no meio destes montes, aparecerá aqui a terra prometida, de onde jorrará leite e mel. Será uma riqueza inconcebível.”  (Maurício Andrés Ribeiro, arquiteto e ecologista, autor dos livros "Ecologizar" e "Tesouros da Índia")

*Fotos de arquivo e da internet.

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