Artista plástica, ex-aluna de Guignard. Maria Helena Andrés tem um currículo extenso como artista, escritora e educadora, com mais de 60 anos de produção e 7 livros publicados. Neste blog, colocará seus relatos de viagens, suas reflexões e vivências cotidianas.
segunda-feira, 26 de dezembro de 2016
PELAS VEREDAS DE SI III
Dando
continuidade ao depoimento de Artur Andrés sobre os exercícios que Gurdjieff
ensinava para seus seguidores, transcrevo o texto abaixo:
“Para
acabar com essa preguiça existencial, uma das propostas de
Gurdjieff
é colocar o corpo para se mexer, por meio da prática de uma
série
de movimentos e danças sagradas desenvolvidas por ele.
Gurdjieff dava enorme importância
à percepção do corpo, que ele
dizia ser uma porta de acesso a
níveis impossíveis de ser atingidos só com a
mente. Por isso, criou os
movimentos e danças sagradas. Assim como as
danças giratórias dos dervixes
sufis, esses movimentos demandam tanta
atenção para serem executados
que, com isso, a pessoa entra num estado de
consciência mais afinado.
É
similar ao que ocorre com diversas outras práticas corporais, como a yoga,
o tai chi ou o kung fu, todas extremamente válidas. No caso das danças
sagradas, elas ainda trabalham junto com amúsica, que ajuda ainda mais a
estabelecer uma profunda conexão interior.
Na realidade, a música não tem
outra função além desta, nos
despertar para níveis superiores
de consciência. No caso das músicas
compostas por Gurdjieff, elas
trabalham com base na lei de ressonância.
Por exemplo, quando se toca uma
determinada nota num instrumento, se há
outro instrumento próximo, ele
ressoa a mesma nota. E o mesmo acontece
conosco. Quando determinada
melodia é tocada, nosso universo interior
também ressoa essa melodia, na
mesma intensidade. Assim, a música não
só toca o nosso centro emocional,
os nossos sentimentos, como os
transforma, nos colocando num
estado mais harmonioso, em sintonia com
as vibrações superiores de nossa
alma.
Gurdjieff
também criou exercícios para se desenvolver o
autoconhecimento
durante as tarefas do cotidiano.
Esses exercícios servem para estimular o que chamamos de
lembrança de si. Um deles é
simples: durante todo o dia, você vai carregar
algum objeto, um jornal, por
exemplo, mas não vai ler. Você deve levá-lo
com você o tempo todo, numa
reunião na empresa, no almoço, seja onde
for, você leva o jornal, mas não
lê. A função desse jornal é apenas servir
como um “despertador”, para que,
sempre que olhar para ele, você se
lembre de si mesmo, de qual é o
seu propósito na vida. Ou você pode botar
um bago de feijão dentro do
sapato; pode usar um modelo de tênis num pé,
e outro modelo no outro; pode
usar meias de cores diferentes. Cada atitude
dessas é um despertador para
ajudá-lo a acordar. Em geral, se usa cada
objeto durante uma semana. Depois
disso, ele começa a perder o efeito, e a
pessoa deve achar outro
despertador.
Um outro “despertador” que
Gurgjieff recomendaria consiste numa situação interessante: sempre que passar
debaixo de uma porta, você
deve procurar lembrar-se de si,
de sentir a si mesmo passando sob aquela
porta. Parece simples, mas, na
maioria das vezes, a pessoa só se lembra do
exercício, ou seja, só se lembra
de si mesma após ter atravessado a porta.
Isso mostra o nosso nível de
desatenção, de desconexão interior. Por isso,
na base de tudo, está o exercício
da lembrança de si. E o que é essa
lembrança de si? É eu me dar
conta de que, ao mesmo tempo em que estou
com a atenção voltada para fora,
outra parte da atenção também é
direcionada para mim. Este é o
ponto-chave: se você consegue lembrar-se
de si a cada instante da vida,
está resolvido o problema.
Isso, claro, não quer dizer que
seja uma lembrança só da cabeça. É
preciso incluir todo o organismo
nesse processo. Saber relaxar o corpo
conscientemente, por exemplo, é
muito importante, pois é através da
sensação corporal que vou entrar
em meu edifício interior. A porta de
entrada é sempre o corpo. A
sensação corporal deve estar sempre presente.
Com isso, uma simples conversa
pode se transformar numa oportunidade
de trabalho interior. Consiste
em procurar estar presente a meu corpo,
sentir alguma parte de mim mesmo, falando de um lugar central de meu ser, em
vez de ficar tagarelando a partir da cabeça. .” (Trechos
da entrevista de Artur Andrés com Lauro Henriques Jr, publicada no livro
“Palavras de Poder”, vol 1, Editora Alaúde)
* Artur Andrés Ribeiro é doutor em música pela
UFMG, onde leciona. É um dos fundadores do grupo Uakti e já trabalhou com Milton
Nascimento, Paul Simon e Philip Glass. É um dos coordenadores do Instituto
Gurdjieff de Belo Horizonte.
*Fotos
da internet
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terça-feira, 20 de dezembro de 2016
PELAS VEREDAS DE SI II
Continuação
da entrevista de Artur Andrés com Lauro Henriques Jr, publicada no livro “Palavras
de Poder”:
“No
livro Encontro com Homens Notáveis,
Gurdjieff fala sobre
como
seria o ser humano ideal: “Só merecerá o nome de homem e
poderá
contar com algo que foi preparado para ele, desde o Alto,
aquele
que tiver sabido adquirir os dados necessários para
conservar
ilesos tanto o lobo como o cordeiro que foram confiados
à sua
guarda”. Nesse
caso, a palavra lobo simboliza o aspecto mais básico do ser humano, o que
inclui os instintos, a parte motora, etc. Já o cordeiro
simboliza o conjunto dos
sentimentos. Ou seja, a questão não é matar o
lobo, como a idéia defendida na
cultura ocidental, de que se deve
extirpar tudo o que é mais
grosseiro, em nome de algo sublime, do alto.
O desafio é ver que, na
realidade, lobo e cordeiro são partes
fundamentais de nossa essência. E
cabe ao homem, por meio de sua
consciência, criar condições para
a coexistência dessas duas esferas de
si.
É como aquela história popular,
de um homem que tem um lobo,
uma cabra e uma couve, e precisa
transportar os três de uma margem
para outra do rio. Acontece que
ele só pode levar uma carga por vez no
barco, e, se ficar vigilante,
corre o risco de o lobo comer a cabra e de a
cabra comer a couve. A solução da
história não só exige que o
barqueiro use de toda sua
engenhosidade, mas também que ele não seja
preguiçoso, pois, para atingir
seu objetivo, terá de cruzar o rio várias
vezes. Ou seja, só merecerá o
nome de homem aquele que, com
consciência, zelar por todos os
aspectos de sua essência, todas as
formas de seu ser.
Agora,
no caminho até esse homem ideal, muitas vezes a maior
dificuldade
está justamente em dar o primeiro passo. Como o próprio
Gurdjieff
disse: “O trabalho sobre si mesmo não é tão difícil quanto
desejar
se trabalhar, e tomar essa decisão”.
Exatamente. Não há nada mais
difícil do que dar o primeiro passo,
sair da inércia. Essa tomada de
decisão é essencial. É como no caso de um
carro, que precisa do start do motor para entrar em
movimento. Depois que
começa a andar, tudo fica mais
fácil, ele se torna até um objeto mais leve.
Por exemplo, se você colocar o pé
debaixo do pneu de um carro parado, vai
sentir um peso enorme, de
centenas de quilos. Agora, se o carro passar a 60
km/h sobre seu pé, talvez você
nem sinta nada. Ou seja, a questão é dar
esse start, é sair desse estado de preguiça mental, física,
emocional, desse
embotamento em que muitas vezes
nos encontramos. E isso vale para
qualquer coisa na vida. Seja para
fazer um regime, praticar uma atividade
física, meditar, realizar um
trabalho de autoconhecimento. Não há passo
mais importante do que o primeiro
passo.
Mas
talvez o maior empecilho para dar esse primeiro passo seja a
nossa
mania de deixar tudo para amanhã. Como diz a frase que
Gurdjieff
escreveu no toldo de seu centro de estudos na França:
“Aquele que tiver se
libertado da ‘doença do amanhã’ terá uma chance
de
obter o que veio procurar aqui”.
Sem dúvida, essa “doença do
amanhã” é o que nos mantém passivos.
Passamos a vida adiando aquilo
que sabemos que deve ser feito, deixando
tudo para o outro dia. É uma
espécie de entendimento deturpado da teoria
das encarnações, achando que está
tudo bem se eu não fizer as coisas agora,
pois terei infinitas vidas para
resolver isso. Pura ilusão. Uma vida
é
perfeitamente suficiente para a
pessoa resolver todas as suas questões, mas,
para isso, tem que se trabalhar.
Não dá para deixar tudo para amanhã.
Afinal, ninguém sabe o que vai
acontecer daqui a um minuto, muito menos
daqui a 24 horas. Por exemplo,
será que vou estar vivo amanhã?
Este é um ponto essencial: nos
lembrarmos de que a morte pode
ocorrer a qualquer momento.
Gurdjieff criou até um exercício para isso:
várias vezes ao dia, a pessoa
deve parar, por 1 ou 2 minutos, e rever o que
fez na última hora que passou,
como se fosse sua última hora de vida. E,
daí, deve se perguntar: “Se eu
morresse agora, estaria feliz com o que fiz
nessa última hora? Será que, de
fato, fiz o meu melhor, fui mais aberto às
pessoas, mais compassivo, mais
atento a mim mesmo?”. Essa consciência
da morte muda nossa relação com a
própria vida. Em vez de ser algo que
nos dá pânico, a morte se torna
uma aliada, que nos mantém mais
conscientes do que devemos fazer.
Aí, então, já não existe mais essa
“doença do amanhã”, essa preguiça
existencial – a vida é hoje.” (Trechos da entrevista
de Artur Andrés com Lauro Henriques Jr, publicada no livro “Palavras de Poder”,
vol 1, Editora Alaúde)
* Artur Andrés Ribeiro é doutor em música pela
UFMG, onde leciona. É um dos fundadores do grupo Uakti e já trabalhou com Milton
Nascimento, Paul Simon e Philip Glass. É um dos coordenadores do Instituto
Gurdjieff de Belo Horizonte.
*Fotos da internet
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GURDJIEFF - PELAS VEREDAS DE SI I
Dando prosseguimento
às nossas reflexões sobre arte e espiritualidade, manifestadas através de
grandes artistas internacionais, especialmente pintores, vamos agora refletir
sobre a arte e o desenvolvimento humano, uma proposta de Ivan Ivanovich
Gurdjieff. Transcrevo abaixo trechos da entrevista de Artur Andrés com Lauro
Henriques Jr, publicada no livro “Palavras de Poder”:
“Os índios Sioux
contam que, certo dia, o Criador reuniu todos os
animais da criação e
disse: “Quero esconder algo muito importante dos
seres humanos, que só
lhes será revelado no dia em que estiverem prontos
para isso. Trata-se
da compreensão de que são eles mesmos que criam a sua
própria realidade”. A
águia logo falou: “Dê para mim, que vou levar este
segredo para a lua”.
“Não”, disse o Criador, “Um dia eles irão até lá e o
acharão”. O salmão,
então, sugeriu: “Vou enterrá-lo nas profundezas do
oceano”. “Não, eles
também irão até lá”, respondeu o Criador. Foi a vez do
búfalo: “Oh, Senhor,
me dê, que vou enterrá-lo no fundo mais fundo das
Grandes Planícies”.
“Não adianta, eles rasgarão a pele da Terra e, mesmo
lá, o encontrarão”.
Foi quando a venerável toupeira, que, por viver no seio
da Mãe Terra, não vê
com olhos físicos, mas, sim, espirituais, disse:
“Coloque esta verdade
dentro do próprio ser humano”. E o Criador
respondeu: “Está
feito”.
“Nascido na Armênia,
então parte do Império Russo, Gurdjieff criou,
no início do século
20, um sistema de ensinamentos que alia o treino
intelectual a uma
variedade de práticas, como meditação, música e dança.
Influenciado pelas
tradições orientais, como a dos sufis muçulmanos, ele
chamava seu sistema
de “trabalho sobre si”, enfatizando que o despertar
espiritual se dá a
partir de um esforço de perscrutar e transformar a si
mesmo. “Uma frase
emblemática de Gurdjieff é esta: ‘Não há injustiça no
mundo.Tudo acontece
exatamente como tem que acontecer.
Se queremos mudar o
curso de nossa vida, precisamos conhecer as forças
que atuam sobre nós
e, a partir dessa consciência, criar meios de nos
libertarmos dessas
forças”.
Gurdjieff dizia que a humanidade
vive num estado de sono
hipnótico, como se fôssemos todos sonâmbulos.
Basta olhar para ver
o quanto vivemos nesse estado de letargia,
fazendo as coisas de
forma automática, sem consciência. Quase todas as
nossas ações são de
natureza mecânica. Nossas ações e nossas relações
também. Por exemplo,
passamos a vida inteira preocupados com o que os
outros acham de nós,
com o que podem pensar a nosso respeito. E vamos
agindo em função
dessa identificação com a opinião do outro, buscando
ganhar a sua
aprovação. Agora, será que aquilo que o outro pensa de mim é
tão importante assim?
Aliás, será que ele realmente está pensando algo de
mim? Na maioria das
vezes, a resposta é não. Mas eu não percebo isso.
Assim como não
percebo meu próprio corpo.
Ninguém se dá conta,
mas estamos o tempo todo submetidos a
milhares de tensões
musculares inúteis, pura perda de energia. E essa
tensão constante só
existe por uma razão: achamos isso normal. É preciso
rever esse
desequilíbrio interno, tampar esses vazamentos de energia e
atenção. E é aí que
entra o que chamamos de “trabalho sobre si”. Se o ser
humano quer, de fato,
atingir todo o seu potencial, se quer sair desse estado
vegetativo, despertar do sono que o escraviza, precisa buscar o
conhecimento de si
mesmo.” (Trechos da entrevista de Artur Andrés com Lauro Henriques Jr,
publicada no livro “Palavras de Poder”, vol 1, Editora Alaúde)
* Artur Andrés Ribeiro é doutor em música pela
UFMG, onde leciona. É um dos fundadores do grupo Uakti e já trabalhou com Milton
Nascimento, Paul Simon e Philip Glass. É um dos coordenadores do Instituto
Gurdjieff de Belo Horizonte.
*Fotos da internet
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segunda-feira, 12 de dezembro de 2016
terça-feira, 6 de dezembro de 2016
EXPOSIÇÃO “DESENHOS”
O texto abaixo, mostrado na exposição de Paulo
Laender, é uma introdução de minha autoria, ao catálogo da sua primeira
exposição coletiva realizada também no Minas Tênis Clube na década de 1960.
“O desenho como base de toda e qualquer forma de
arte é aquele que desperta a sensibilidade do artista para ver as formas da
natureza e recriá-las.
Não será nunca um desenho rígido, acadêmico, mas uma
disciplina necessária, uma educação da capacidade de observar e de sentir.
O desenho simples, linear, bem construído, visando
uma compreensão maior da composição, constitui o primeiro passo para a formação
do jovem artista.
Hoje o
desenho pode equilibrar-se perfeitamente com as outras artes, obedecendo em
princípio às mesmas necessidades plásticas. Linhas e massas, texturas e
nuances, expressam-se por si, falando sua própria linguagem. Desenhar bem não é
necessariamente copiar bem. A densidade maior ou menos dos traços, as linhas
que se cortam, a mão que se comprime nervosamente, para depois expandir-se de
maneira mais leve, constituem a mensagem sensível da alma do artista,
difundindo o seu pensamento mais profundo. O desenho traduz um estado de alma,
e o traduz de modo mais direto do que as outras formas de arte, onde às vezes a
necessidade técnica condensa e controla a emoção criadora.
Aqui estão três jovens desenhistas reunidos numa
primeira exposição.
Paulo Laender, com um desenho equilibrado, meditado,
procura o tema de barcos e figuras centralizando a composição. As formas surgem
dentro de outras formas, num ritmo organizado e inventivo, revelando vida
interior e grande capacidade de concentração no trabalho.
Antônio Eugênio Salles Coelho, usando também o mesmo
material, valoriza a textura dos grandes espaços com uma infinidade de pequenos
traços, que não chegam a determinar, mas apenas sugerir o mundo fantástico das
formas orgânicas.
Luiz Lanza, utiliza-se da figura humana demonstrando
grande segurança em seu traço rápido, que, muitas vezes é interrompido, para
acentuar a expressão da forma através da linha inacabada.
Aí estão seus trabalhos e o esforço de muitos dias e
noites dedicados à arte. Espero que eles sirvam de estímulo a outros jovens e de incentivo ao
Departamento Cultural e Artístico do Minas Tênis Clube que, de maneira tão
simpática se prontificou a auxiliá-los.
Maria Helena Andrés.” (Apresentação do catálogo da
exposição “Desenhos”)
*Fotos de arquivo
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segunda-feira, 28 de novembro de 2016
PAULO LAENDER, UMA TRAJETÓRIA
Estou na Galeria de Arte do Minas Tênis Clube,
percorrendo uma exposição de Paulo Laender. Ele mostra sua trajetória na arte,
desde a sua primeira exposição no Minas Tênis Clube, a convite de Palhano
Junior. Na ocasião ele mostrou desenhos de 1963. No catálogo desta mostra coletiva estão : Paulo Frade Laender, Luiz Antonio
Lanza e Antonio Eugênio de Salles Coelho. Para esses três artistas, a vida foi
mostrando caminhos diferentes.
Paulo Laender viveu etapas diversas de sua arte,
sempre conservando uma ligação de uma fase com a outra.
Talvez poderíamos dizer: crescimento orgânico, como
uma árvore que vai conservando as características de sua espécie e vai
crescendo, tomando formas variadas mas sempre ligadas umas com as outras, com
uma coerência impressionante. Exemplo de Unidade na Diversidade. Isto porque na
diversidade de materiais, gravuras em metal, desenhos, pinturas, esculturas, há
sempre uma unidade que caracteriza o artista.
Paulo Laender foi meu aluno, e desde os desenhos dos
primeiros barcos, já demonstrava a sua escolha pelas formas curvas. Há também
uma característica que nos mostra a busca dessas formas curvas. Os barcos de
1963 nos mostram o jovem talento despertando para uma viagem ao desconhecido. O barco simboliza viagem e Paulo Laender
viajou, percorreu o mundo, mas agora em seu atelier de Nova Lima, continua a
grande viagem pelos caminhos da arte. O perfeccionismo de suas obras é
fascinante e a sensualidade de suas formas nos lembra os grandes mestres do
barroco mineiro. Os portugueses trouxeram para nós o barroco e, em terras
brasileiras, produziram suas melhores obras que até hoje estão nas igrejas de
Ouro Preto, Tiradentes, São João Del Rey e Sabará.
Paulo retoma o barroco em seu espírito, transcendendo
a forma e elevando-a a um plano de grande contemporaneidade.
Ele é um artista barroco e contemporâneo, está
presente no seu tempo, corajosamente enfrentando as dificuldades que a arte nos
impõe. Em suas esculturas, inspiradas em andanças pela Índia, admiramos a
figura de Ganesh, aquele que abre os caminhos. Sem reproduzir a figura de
Ganesh, ele nos mostra o seu espírito e a sua atitude resoluta e firme.
Voltando ao Brasil, encontramos o escultor
trabalhando na forma de barcos. Grandes
troncos de árvores são esculpidos lembrando a forma dos nossos barcos indígenas
e dos barqueiros do São Francisco.
Agora, o barco não é mais desenhado, mas esculpido
na madeira laminada, colada e cavilhada, característica muito especial de seu
estilo como escultor. Paulo desce às nossas origens, rebusca seus antepassados
indígenas e os artistas e artesãos que construíram o patrimônio artístico de
Minas Gerais.
Ser universal e ao mesmo tempo regional é a grande
lição que este artista mineiro está dando para as gerações futuras.
Paulo Laender é um artista consciente, maduro. Não
busca modismos nem influências externas, mas é dentro dele mesmo, em seu
interior que ele vai buscar motivações para o seu trabalho.
Esta busca interior às vezes é também figurada em
esculturas ou objetos, onde outras formas menores estão colocadas mostrando o
mundo externo e o mundo interno que continua existindo em toda a natureza e na
criação.
*Fotos de Eliana Andrés
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segunda-feira, 21 de novembro de 2016
ABSTRACIONISMO E ESPIRITUALIDADE III
Vários artistas ocidentais têm buscado expressar a
instantaneidade do momento criador, captando alguns dos mais característicos
símbolos orientais. Na intensidade emocional do gesto, aproximam-se da escrita
chinesa e, procurando o depuramento da forma, muitas vezes trazem à luz formas
semelhantes às mandalas tântricas. O Abstracionismo, portanto, seja em seu
aspecto informal, seja em seu aspecto geométrico, constitui uma aproximação do
Oriente com o Ocidente.
Essa busca de valorização do momento presente, da
instantaneidade da criação, introduziu-se na arte do Ocidente por intermédio de
Mathieu, na França, e da Action Painting , nos EUA. Mathieu declara na Analogia da Não Figuração :
"A atividade do artista, paralela à do sábio e à do
santo, comunica-se com todas as forças vivas do cosmos e aproxima-se do
pensamento científico moderno, no qual os meios de apreensão do universo já não
são fornecidos só pela razão e pelos sentidos."
Proclamando a necessidade do artista de realizar a
síntese da arte e vida, Mathieu buscou conhecer o mundo fazendo viagens e procurou o encontro consigo mesmo
nas meditações. Seus quadros, realizados na maior velocidade para apreenderem o
mais rápido possível a essência criadora, assemelham-se à caligrafia oriental.
Nos EUA, Jackson Pollock, Mark Tobey, Franz Kline,
Theodorus Stamus, James Brooks, William de Kooning, Gottlieb e outros iniciaram
o movimento da Action Painting , que
enfatizou intensamente a pintura gestual e o automatismo psíquico. O método de
Pollock foi o de entrar no processo criador, submergindo na pintura como o
calígrafo chinês, a fim de transmitir a energia
Ch’i. Seus quadros, de um intenso grafismo, assemelham-se à escrita do
Extremo Oriente e o seu modo de pintar lembra o dos índios navajos, que vertiam
areia colorida no solo, a fim de marcar seus talismãs.
Mark Tobey, influenciado
pela filosofia Zen, usou como suporte
quadros menores e tintas que permitiam rápida secagem, para conseguir, no ato
de pintar, a simultaneidade da ideia e da realização.
A arte abstrata possibilita uma comunicação direta
com as forças mais profundas do ser humano. Neste encontro consigo mesmo,
pode-se descobrir a fonte comum que dá origem a outras formas de arte, como a
dança e a música.
Vivenciar o ritmo na arte é também descobrir o ritmo
de nossa própria vida. (Caminhos da Arte, 3° Edição, Editora C/ARTE)
*Fotos da internet
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