Artista plástica, ex-aluna de Guignard. Maria Helena Andrés tem um currículo extenso como artista, escritora e educadora, com mais de 60 anos de produção e 7 livros publicados. Neste blog, colocará seus relatos de viagens, suas reflexões e vivências cotidianas.
domingo, 29 de novembro de 2020
"A ÁGUA FALA", UMA ENTREVISTA I
Recebi de Maurício Andrés o texto abaixo que se refere a uma entrevista para a revista “Planetapontocom”.
Agradecemos à Silvana Gontijo a gentileza de nos
ceder a entrevista para ser publicada neste blog.
“Para as
próximas gerações será cada vez mais vital ter não apenas conhecimento
especializado, mas sim uma consciência holística e integral sobre a
água. Resultado de uma autoria coletiva composta por Maria Helena,
Aparecida e Maurício Andrés, o livro A água fala traz a água como primeira pessoa do singular,
como se a narrativa fosse contada por ela.
Dividido
em cinco partes, o título descreve uma viagem pelo ciclo completo da água no
ambiente, seu movimento, sua presença nos corpos vivos, na cultura e as questões
relacionadas com o seu uso. A obra, permeada por ilustrações da artista Maria
Helena Andrés, uma das autoras, é dirigida aos jovens numa linguagem sintética
e poética.
Na
primeira parte, o leitor é convidado a se aproximar da água e a conhecer suas
viagens pelo universo e pela Terra. Em primeira pessoa, ela descreve como
circula no meio ambiente e mostra os diversos estados que assume diante do
calor e do frio e das mudanças de temperatura que a tornam vapor, líquida ou
sólida. Além disso, mostra que pode ser doce, salobra ou salgada e como é um
sinal que indica a existência de vida.
Já na
segunda parte, o leitor é convidado a acompanhar a água em seu movimento,
vivenciando as formas que ela assume e os diversos lugares que ocupa nos céus,
na terra, no subsolo como granizo, chuva, flocos de neve. Ao longo da
narrativa, a água então descreve seu ciclo, com a precipitação, a evaporação, a
infiltração no solo, mostrando como surge em nascentes e provoca a erosão dos
solos, as enchentes, as inundações e as secas.
A
terceira parte descreve o caminho da água nos corpos vivos de seres humanos,
animais e plantas e ressalta seu papel e importância para a vida. Ela está na
seiva que transporta sais minerais nas plantas que a transpiram para o
ambiente, nos líquidos dos corpos vivos, como as lágrimas, o suor, o sangue, a
urina, no líquido em que os bebês vivem no útero das mães, na limpeza dos
corpos nos banhos, entre outras tantas possibilidades.
Por ser
tema frequente na cultura, nas religiões e nas artes, a quarta parte do livro
aponta a água como ela é cantada, falada e mostrada nas diversas manifestações
culturais e artísticas, seja na música, na poesia, na dança, no urbanismo e no
paisagismo. Em muitas tradições espirituais ela é sagrada e está presente em
rituais, como o batismo cristão, e nas narrativas bíblicas, como a do dilúvio.
Em outras tradições, há deuses e deusas ligados à água e rituais como a dança
da chuva dos índios. Muitas palavras em diferentes idiomas se referem a ela e
muitos lugares e cidades têm nomes relacionados com as águas.
O livro
realça ainda alguns dos múltiplos usos da água na quinta e última parte: para o
abastecimento humano e para matar a sedes dos animais, para a agricultura na
irrigação, para a geração de energia, para o transporte, para a pesca, a
recreação, o lazer e o turismo. Dessa forma, a obra ressalta a necessidade dos
indivíduos pelos recursos hídricos para manter a saúde e o bem-estar.
Além
disso, o livro denuncia os desperdícios que acontecem acerca do consumo da
água, enfatizando os problemas e a insegurança decorrentes de sua escassez ou
excesso, com as secas e as inundações. Paralelamente, mostra a importância de
se construírem obras tais como açudes, canais, aquedutos, estações de
tratamento de água e de esgotos e de conservar os solos e promover sua proteção
como uma riqueza de grande valor. A importância de se desenvolver a cooperação
em torno da água também está presente, incluindo a necessidade do diálogo e da
crítica direcionada a rivalidades, conflitos e violência entre aqueles que dela
precisam e que a disputam.
Com
versões em quatro idiomas (português, inglês, francês e italiano), o livro já está disponível em
formato eletrônico e a tradução para a versão em espanhol se encontra em fase
de revisão. “ (Revista Planetapontocom)
FOTOS DE ARQUIVO
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domingo, 22 de novembro de 2020
PABLO NERUDA
Eu estava no Chile, na embaixada do Brasil, quando inaugurei a primeira exposição de desenhos sobre papel veludo. Estava inaugurando a Galeria da Embaixada. A exposição teve como curador o poeta Tiago de Melo, adido cultural do Brasil naquele país e organizador da exposição e de todos os eventos culturais.Tiago era muito conhecido no Chile, tinha contato com todos os artistas.
Juíta Salles de Alencar, a embaixatriz, esposa do
embaixador Fernando Alencar, com sua espontaneidade e simpatia, acolhia a todos
na embaixada. Fiquei conhecendo vários artistas, trocamos idéias e quadros.
Tiago de Melo me fez chegar até Pablo Neruda, o
grande poeta chileno, conhecido internacionalmente. Neruda tinha uma casa de
campo à beira mar, na “Isla Negra” em Valparaíso e foi ali que nos conhecemos. A
casa era decorada com obras de arte e
atualmente tornou-se o Museu Pablo Neruda.
Um imenso cavalo de madeira chamava a atenção do visitante.
Uma atmosfera mágica ia nos mostrando um passado sujeito a mudanças, inclusive
provocadas por terremotos.
Durante o almoço, num restaurante de frente para a
praia, serviram frutos do mar. Neruda sentou ao meu lado, numa varanda que dava
para o Pacífico.
Tudo muito bem organizado, restaurante de luxo,
gente muito alegre e comunicativa. Acontece que eu não gostava de mariscos e
aquele era o prato principal. Procurei disfarçar, comi um pouco para não ser
mal educada. Neruda percebeu e cochichou no meu ouvido.
- “A senhora não gosta, me passa o seu prato,
ninguém vai perceber nada”.
Segui os conselhos do poeta e trocamos de prato. Ninguém
viu, estavam em outras conversas. Durante o almoço falamos muito sobre arte e política
no Brasil. Era 1963 e havia no Brasil uma grande efervescência política.
Naquela viagem tive a oportunidade de conhecer
Neruda, um poeta latino- americano cujas palavras atravessaram os Andes e se
projetaram no planeta. Ali, sentada à beira mar, as palavras de Neruda me
abriram novos caminhos e sua atitude, cordial e simpática, me permitiu conhecer
este outro aspecto de Neruda, a solidariedade.
A solidariedade é uma forma de perceber o outro, e
nesse caso, foi uma cumplicidade que envolveu duas pessoas com paladares
diferentes.
Segue poema de Pablo Neruda:
“SONETO XVII
Amo-te como a planta que não floriu e tem
dentro de si, escondida, a luz das flores,
e, graças ao teu amor, vive obscuro em meu corpo
o denso aroma que subiu da terra.
Amo-te sem saber como, nem quando, nem onde,
amo-te diretamente sem problemas nem orgulho:
amo-te assim porque não sei amar de outra maneira,
a não ser deste modo em que nem eu sou nem tu és,
tão perto que a tua mão no meu peito é minha,
tão perto que os teus olhos se fecham com meu sono.”
*FOTOS DA INTERNET
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sábado, 14 de novembro de 2020
REDES SOCIAIS
Costumo receber nas redes sociais artigos maravilhosos, poemas de Mário de Andrade, pensamentos de Heráclito, Sri Aurobindo, Trigueirinho.
Todos eles existiram neste planeta e agora viajam
para outras dimensões.
Gosto de ouvir as Cantigas de Santa Maria de Don
Afonso X que, de acordo com pesquisas, é nosso ancestral.
Quanta coisa a gente recebe pela internet e elas nos
elevam do plano denso, para outro superior, cheio de luz.
Posso escutar no Youtube a música de Alexandre
Andrés, a flauta do Artur. E ver os dedos de Regina no teclado, acompanhando
Artur na vida, inspirado no nosso momento atual.
Também na internet, Ivana e Luciano interpretam
poemas e postam vídeos.
Os meus blogs, há mais de 10 anos viajam pelo mundo
levando um pouco do Brasil para países distantes.
E quantos outros acontecimentos, como o aniversário
de Gilberto Gil e as andanças de Caetano Veloso pelo mundo com seus filhos,
tudo isso e inúmeros outros eventos e “lives”, podemos acompanhar pela internet.
Não é preciso de muito esforço, apenas um “clic” no lugar certo, e podemos
acompanhar a “live” da Orquestra 415 ou escutar a filarmônica de Belo Horizonte
atuando ao vivo. Lembro-me da emoção ao assistir a “Marselhesa” cantada por uma
artista afro-descendente, proclamando a união dos povos do mundo.
Tudo isto é lindo, produzido por pessoas escolhidas
pelos guias espirituais que nos ajudam nesta travessia da vida.
Viver plenamente é estar aberto para o que nos
circunda, saber separar o joio do trigo.
E olha, não estacione no joio. Ele pode nos conduzir
à parte negativa que existe dentro de nós.
O que fazer?
Passar adiante, porque se está escuro, também existe
a possibilidade de apreciar o canto da vida.
Nos programas culturais, as redes nos conduzem às pessoas
mais distantes, podemos assistir aulas projetadas por João Diniz entrevistando
Maurício em Brasília e Marília em Belo Horizonte e ter a oportunidade de
aprender alguma coisa sobre os anos 60 em BH.
Daqui do Retiro das Pedras, sentada em frente à tela
do computador, os personagens da família vão surgindo, conversamos, trocamos
idéias. O aniversário de minha irmã Maria Regina foi comemorado on line,com
pessoas de diversos países, irmãos e sobrinhos.
Gosto de enumerar os aspectos positivos da internet,
tem muita gente que se recusa a aceitar as novas mídias.
Hoje, assisti uma live sobre a Covid 19, de Carlos
Starling, médico e infectologista. Aprendi muito. Ele nos lembra que a vacina é
um bem universal e deve ser compartilhada por cientistas de vários países.
Ontem, passei a tarde escutando a música de Keith
Jarret, “The Koel Concert”, que é considerado um divisor de águas na história
do Jazz.
Uma das maiores influências que ele recebeu nesse
período, segundo Artur Andrés, foi o contato que ele teve com a música de
Gurdjieff de Hartman, compositor e mestre espiritualista russo.
Gurdjieff, com suas pesquisas no oriente,
influenciou vários músicos, inclusive Artur Andrés que já publicou uma série de
músicas do mestre russo.
Neste blog, não posso me estender em detalhes de
cada obra, mas apenas aponto o quanto as mídias podem nos ajudar nesta
quarentena que estamos vivendo.
Depende de nós escolhermos o que nos faz bem.
*FOTOS DE ARQUIVO
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domingo, 8 de novembro de 2020
VOLTA ÀS AULAS NA ESCOLA GUIGNARD
A Escola Guignard significou muito para mim, desde o seu início, em 1944. Guignard nos fez ver um ensino de arte inovador, onde o despertar do novo prevalecia sobre a cópia dos métodos antigos.
No momento, é bom recordar o que ele nos trouxe e o
que podemos fazer para dar continuidade à escolha que fizemos. Seguir Guignard
não é copiar seu estilo, mas compreender que a arte, sob todos os seus aspectos,
é o que vai nos sustentar na caminhada pela vida.
Somos todos viajantes neste mundo, levando conosco a
bandeira da criação. Aprendemos muito sobre arte e vida nesta Escola de arte.
- “Por que escolhemos estudar e seguir o caminho das
artes?”
O caminho das artes é um caminho muito rico, porque
nos faz mais felizes. O importante é começar a perceber que ele nos permite
crescer como seres humanos. Arte é trabalho e este trabalho é vida.
Nesses dias de quarentena, quando nos sentimos
confinados dentro de casa, percebemos com mais clareza o quanto podemos
transpor obstáculos, nos dedicando a um trabalho escolhido por nós, como
vocação insubstituível. Nossa vida pode se tornar uma arte na poética do
cotidiano.
Guignard nos levava à contemplação da natureza, em
suas caminhadas pelo parque municipal. Ele nos incentivava à observação das texturas
dos troncos de árvores, das diferentes tonalidades de verde, dos céus de Minas
com um azul metálico, dos muros velhos. Era necessário observar para depois
desenhar ou pintar. O parque, naquela ocasião, foi motivo de muito aprendizado. Aprendi com
Guignard a valorizar o cotidiano, desenhando objetos de uso diário, que também,
silenciosamente, nos ensinam. Ele nos ensinava a observar e desenhar, desenhar
muito, com lápis duro, 6H, para depois rabiscar rapidamente, em linha contínua
os objetos, pessoas e paisagens. Essa linha contínua me acompanha até os dias
de hoje e já me permitiu transformá-la em esculturas de aço ou simplesmente
desenhos em bico de pena. Desenhar é fundamental, é dali que partimos para
maiores dimensões.
Agora, no século XXI e, as vésperas do ano 2021,
procurei me informar sobre as atividades da Escola e me chamou à atenção o interesse dos alunos sobre o
sorteio de dois livros e um DVD sobre o ensino de arte no Brasil: Augusto
Rodrigues e Helena Antipoff, grandes
arte educadores.
Vivemos a época das lives, dos zoons, dos encontros virtuais. O encontro com as novas
mídias é anunciado nos salões e nas plataformas virtuais da Escola. Vale
lembrar a atuação da professora Sonia Laboriau, coordenadora do Grupo de estudos e produção de arte GEA,
o projeto de professores pesquisadores da Escola e a exposição virtual Entre o isolamento e o contato,
coordenada por Celina Lage, que resultou num livro de artista on line.
Gostaria, no momento, de aprender com vocês, jovens
professores alinhados às novas mídias. Sou muito interessada no aprender e acho
que esse interesse constitui um estímulo para o viver.
Deixo o meu incentivo para vocês, alunos e
professores da Escola para continuar nessa direção, com muita alegria e sucesso
na caminhada pela vida.
Um abraço para todos e um agradecimento especial
para a Lorena D’Arc, diretora da Escola, pelo seu convite.
Maria Helena Andrés
PARA ASSISTIR À AULA INAUGURAL:
https://youtu.be/8yGutNWWrrU
*Fotos da internet
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segunda-feira, 2 de novembro de 2020
FREDERICO MORAIS
Estou frente à TV, assistindo no Canal Curta, os Domingos de Criação de Frederico Morais, um sucesso conquistado por um mineiro no Rio de Janeiro. Vejo na tela o quanto ele conquistou o Rio, numa época ainda sombria, em plena ditadura militar. Vejo a alegria e a descontração dos cariocas, pessoas idosas, jovens, crianças, todas participando de um momento único nos jardins do Museu de Arte Moderna.
Havia uma energia coletiva com aquela possibilidade
de criar juntos, esquecer os problemas cotidianos e mergulhar no mundo mágico
da criação. Frederico distribuía rolos de papel e rolos de pano, tintas,
pincéis, abrindo a todos a possibilidade de criar sem medo de errar. No
documentário estão artistas e poetas famosos, como Cildo Meireles e Silviano
Santiago.
Em torno de Frederico, vejo os repórteres tomando nota,
fazendo perguntas. A reportagem nos conduziu até a casa dele, no bairro Santa
Teresa, e à sua enorme biblioteca, onde ele pode falar um pouco sobre sua vida.
- “Perdi meu pai cedo e comecei a trabalhar na
adolescência.”
Lembro de Frederico em Belo Horizonte, quando ele,
ainda com seus 17 anos, trabalhava no Banco Vera Cruz, na rua dos Caetés. Eu
tinha pintado um biombo para o Banco, na minha fase construtiva e Frederico gostava
muito de arte. Quando eu chegava no Banco, para movimentar o meu dinheiro, ele
corria para me atender. Foi uma amizade que começou na década de 1950, quando
eu participava das bienais e me dedicava à minha família e à minha arte.
Anos mais tarde ele me chamou para chupar
jabuticabas no seu sítio, no bairro Santa Lúcia e ali encontrei com sua esposa
Wilma Martins, grande artista, hoje nacionalmente reconhecida. Wilma foi minha
aluna na Guignard, e por seu merecido talento, ganhou naquela época o primeiro
lugar no Salão da Prefeitura de Belo Horizonte. Eu era parte do júri. Depois
nos perdemos de vista.
Frederico foi morar no Rio, conquistou o público
carioca. Em um dos depoimentos ele diz: “Devo ter feito a cabeça de muita
gente”.
Frederico se tornou um artista conceitual e dedicou
também aos áudios-visuais, uma forma de fazer arte que antecipou os videos. Uma
de suas propostas conceituais foi realizada no evento Do corpo à terra e teve a participação do meu filho, Maurício, como
fotógrafo. A amizade dele com os Andrés se estendeu também à minha filha
Marília, que defendeu uma tese sobre as Neovanguardas de Belo Horizonte nos
anos 1960, cuja participação de Frederico Morais foi muito importante.
E foi neste documentário sobre este grande critico,
curador e artista que eu pude também participar à distância dos famosos
“Domingos de Criação”.
Parabéns, Frederico Morais,
você conquistou um espaço na arte brasileira que nunca será esquecido.
*FOTOS DE IVANA ANDRÉS
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