terça-feira, 25 de setembro de 2018


CRÍTICAS DA DÉCADA DE 60 IV


Nesta postagem, dou continuidade às críticas sobre a minha obra, da década de 60.

MADONAS

Esta exposição de Maria Helena Andrés deve ser encarada como uma face de sua arte e, não, como uma fase. Os trabalhos apresentados deixam transparecer a mesma identidade de impulso criador que originou a temática dos barcos veleiros, da guerra e das máquinas. Tratamento e tema variam, mas a dinâmica do traço ( e, por extensão, a dos tons e das cores) alimenta-se da mesma seiva de inconformismo às fórmulas mágicas, de incessante pesquisa no terreno da abstração ordenadora.
         Seria fácil dizer-se que Maria Helena Andrés encontra-se na fase das madonas. Há, mesmo, uma tentação nesse sentido, que seria o de ruptura. Acontece, porém, que os trabalhos imediatamente anteriores da artista - veleiros, guerra, máquinas - ligam-se aos atuais pelo mesmo processo de ordenação e simplificação do campo do visível e do intuitível. Variam, sim, o tratamento, os materiais e os temas. Prossegue, entretanto, o sentido da linha na procura de uma expressão cada vez mais enriquecida.
         Nesta face, ganha relevo o fato de que existe em cada quadro um núcleo figurativo audaz. Em torno dele, as linhas se desenvolvem no sentido de compor uma atmosfera própria, um clima barroco. E não apenas as linhas, mas também os tons, as cores (e a luz) funcionam nessa direção, formando tudo uma unidade cerrada causadora de uma só e forte impressão formal.
         Cada quadro desta exposição, por força até das raízes comuns àquilo que seria a fase mais longa, cumpre com maestria uma função orgânica no sentido estético. Elementos claramente distintos uns dos outros, todos necessários, se conjugam para uma conclusão de referências e de nexos de grande valor plástico.
         É de se ressaltar ainda nesta face de Maria Helena Andrés um de seus detalhes técnicos transbordante de espírito barroco. É o da repetição dos elementos gráficos, também chamado recorrência. O alinhamento repetitivo, a partir centro nucleado, conduz a um resultado muito eficaz, dando significado ao que, de outro modo, não a teria. Os artistas mineiros do século XVII sentiram, ou intuíram, as possibilidades da conjugação dos elementos soltos, isolados para o resultado de uma impressão global. Maria Helena Andrés retoma a experiência em plano atualizado, recriando-a em sua essencialidade. Funde, assim, sentido de tempo a algo que permaneceria restrito a sentido de espaço. E alcança a unidade não procurada na variedade que soube alcançar pelo talento e pelo exercício.”

         José Guimarães Alves
         Catálogo da exposição realizada na Galeria Grupiara, Belo Horizonte, agosto de 1966


  “(...)o barroco se caracteriza pelo claro/escuro, e não por um contraste radical entre as cores. Esse clima da nuância, do matiz, portanto, entre na poesia de Drummond, na arte de Maria Helena Andrés, de Sara Ávila, e tantos outros, onde percebemos um elemento de ambigüidade que é francamente barroco. Ainda mais, depois que Guignard colocou atmosfera nas nossas cores, e este atmosferizar dá um sentido de penumbra, de nuância e de matiz, que está em todos os artistas que herdaram do barroco, via Alberto da Veiga Guignard.”

         Moacyr Laterza
         Trecho da entrevista dada a Carlos Herculano Lopes. Estado de Minas, Belo Horizonte, 21 de setembro de 1997.

*Fotos de arquivo

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segunda-feira, 17 de setembro de 2018


CRÍTICAS DA DÉCADA DE 60 III


FASE DE GUERRA

            “Na sutileza das transparências, no exagero da sensibilidade, na leveza dos tons, as emoções relembradas por Maria Helena, seja nos óleos ou nas aguadas, são apenas do lado bom da vida. Mesmo quando sua temática se voltou para os aspectos da guerra, motivada por uma época trágica, a artista sempre deixou evidente em seus quadros, ao lado das formas destruídas aparentemente, a impressão de beleza e o desejo de paz na comunicação da arte.”

            Mari’Stella Tristão, Estado de Minas - 1970

  “Ao dinamismo bastante espontâneo e lírico dos desenhos e pinturas anteriores, quase todos com reminiscências de barcos, e velas, sucede agora por necessidade de complementação, a fase em que o espontâneo é controlado pelos elementos da colagem. Os recortes figurativos de rodas, estruturas, máquinas, engrenagens, são entrosadas à composição inicial estruturando a um modo mais firme e violento. Não houve um salto de uma fase para outra, mas a continuação de pesquisas anteriores em que acrescentou a colagem. Os trabalhos atuais lembram o movimento da vida moderna, o dinamismo do mundo em que vivemos e do homem profundamente ligado à máquina.”

            Jayme Maurício. Correio da Manhã, 1965.

  “Há uma forma que se pode dizer constante na obra de Maria Helena: os barcos. Os barcos, sugeridos muitas vezes por entre formas abstratas e nos quadros dados como informais, podem levar-nos a uma série de interpretações. Maria Helena admite uma necessidade de viagem, de descobrir novos mundos, que ela sempre alimentou. Há uma longa fase de sua pintura em que os barcos, navios, se tornaram bastante visíveis. Depois, por volta de 1964, ela passou a figurar máquinas voadoras hoje cristalizadas numa pintura que se pode chamar de “figuração científica”, pois refletem a preocupação da artista pelos últimos acontecimentos da “era espacial”: os cosmonautas chegando à lua. Toda esta pintura reflete um temperamento sonhador, talvez um tanto romântico, com projeção de estados oníricos. Mas houve uma fase dramática em que a artista, consciente de seu tempo, documenta a guerra com muitas de suas implicações. Esta pintura se torna mais dramática porque, junto a formas abstratas, ela usou de colagens realistas, marcando fortemente esta atmosfera de caos e tragédia em que vivemos.

            Márcio Sampaio
            Maria Helena Andrés: Arte vivida dia a dia”, Revista Minas Gerais - Ano 1, nº 1, Belo Horizonte, março/abril de 1969

*Fotos de arquivo

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segunda-feira, 10 de setembro de 2018


O PODER DA MÚSICA


Por ocasião do Encontro entre Culturas Brasil- Índia, na inauguração da Casa do Butão, foi lido o texto abaixo de minha autoria, que focaliza a música, os sons da natureza e a busca da harmonia do ser humano por meio da harmonia dos sons.

Se observarmos com atenção, verificaremos que a música se manifesta em tudo aquilo que tem vida: no sopro do vento, no som do mar, no estrondo do trovão, no canto dos pássaros, no zumbido dos insetos. Toda a natureza é música constante. Fazemos parte também dessa grande orquestra universal. Nos momentos de silêncio, quando escutamos as pulsações do nosso corpo, começamos a observar que elas fazem coro com as pulsações da natureza. Nossa respiração é ritmo e harmoniza-se com as batidas do coração, pulso e cabeça. Diante de nós a natureza está pulsando em som ritmado. Todo o espaço está cheio de sons.

Podemos ver nas diversas religiões, a busca da harmonia do ser humano por meio da harmonia dos sons. Na Bíblia, David conseguiu amenizar com uma harpa a cólera do rei Saul. Ao som de uma lira, Pitágoras transmutava as vibrações dos seus discípulos. Na mitologia grega, os primeiros grandes músicos foram os deuses. Apolo, deus da Beleza e da Arte, é conhecido como o músico que, ao tocar a lira, encantava os deuses do Olimpo. Pã inventou a flauta de cana e ao som de sua música se irmanava com os pássaros e com toda a natureza.

Entre os mortais descendentes dos deuses gregos destacava-se Orfeu, que, sob a magia de sua música, fazia mover os rochedos, os montes e o curso dos rios.
Na Índia, a mitologia não significa apenas uma lembrança do passado, mas está viva no cotidiano das pessoas.  A figura de Krishna, deus do Amor, tocando sua flauta, atrai as Gopis (jovens camponesas). A atração delas por Krishna simboliza a aspiração humana de união com o Criador.

A tradição hinduísta dá ao mantra, ou som místico, um significado profundo dentro de sua religião. Trata-se de um recurso para o yogue atingir o som inaudível e não manifesto. Por meio do som ele busca alcançar a Realidade Última. De acordo com o Yoga, cada objeto tem um som natural, que pode ser captado, modificado e sintonizado com a música universal. Para os Sufis, “aquele que conhece o mistério do som sabe o mistério de todo universo”.

Nós não conseguimos ouvir o som abstrato que nos circunda e envolve, porque estamos com a consciência centralizada em nós mesmos, em nossos problemas e na vida material. Mas, segundo eles, aquele que tiver a capacidade de sintonizar-se com esse som conhecerá o presente, o passado e o futuro.

Também os cristãos referem-se de modo semelhante a essa música interior. Sertillanges, um dos maiores pensadores católicos, refere-se à interpenetração entre essa música interna e todo o universo, mostrando-nos como a harmonia das esferas, da qual falavam os antigos, corresponde a uma vibração de almas que cada um de nós escutaria se descesse profundamente dentro de si mesmo. Dela participam bons e maus, grandes e pequenos, poderosos e humildes. Ninguém estaria excluído desse conjunto, que visa a unidade na multiplicidade.

*Fotos de Maurício Andrés

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terça-feira, 4 de setembro de 2018


TEXTOS CRÍTICOS DA DÉCADA DE 60 II


Dando continuidade aos textos críticos da década de 60, transcrevo,dentre outros autores, textos em inglês, escritos por ocasião de exposição nos EUA.

“Miss Andres’ pastels in the ground floor lounge are beautifully executed abstractions, dynamic arrangements of many diaphonous strokes (as if done with the side of the chalk) reinforced with heavier areas of similar shapes of considerable variety, most of the paintings in black, white and grays, deep blue and a few other colors. In strong contrast with their light backgrounds, these compositions in some instances suggest sailing vessels in full rig”

Os pastéis de Maria Helena Andrés são abstrações magnificamente executados, arranjos dinâmicos de traços diáfanos, com áreas mais fortes, em considerável variedade de valores, a maioria dos trabalhos em preto, branco, cinza e azul profundo. Fazendo contraste com o fundo claro, suas composições sugerem navios a vela em grande velocidade.”

         Florence S. Berryman
         The Sunday Star, Washington D.C., U.S.A., April 2, 1961


         “There is a quasi-explosive quality to Andrés works dominated by swirling, fleeting rhythmic units that pervade all he abstractions. The nonrepresentational movements result in a symphony which, less structural than Tintoretto or Rubens, results in a creative charm in the variety and activity of her color and linear effects. The manner of application of color, by which a minimum of pigment yields a maximum of color effect, is a triumph as an economy of means.
         In her sense for compositional relation of masses, both in two and three dimensional treatment, Andrés ranks high as an artist. Her light is well used to diversify her designs with modelling and space relations subdued and at times eliminated entirely emphasize the decorative aspects of her drawings. Line and color are used with such a degree of sensitivity that she renders and emotional impact upon the observer.”

         P. Matticole
         Written during the exibition of the artist on Pan American Union, Washington D.C., U.S.A., March 1961


         “Suas composições nos apresenta uma clara, nítida canção gráfica, delicadamente recamada em tonalidades suaves. Além da constante negra, os azuis, os terras, até brancos, intervêm nos desdobramentos de seu lirismo informal, em que encontramos, permanentemente, uma nucleação, ainda quando esta pareça fragmentada. Há uma determinada fragilidade que apreciaríamos ver compensada por qualquer elemento, nesses vôos espaciais de folhas quebradas, de hastes, de enrocamentos, levemente indicados, de cristais partidos, de murmurações de ramas de sonho. Há uma grande unidade conceptiva e de execução na arte do desenho de Maria Helena”

         José Geraldo Vieira
         “Tendências diversas em três desenhistas”, Estado de São Paulo, São Paulo, abril de 1962

        
“Já sua pintura se encontra enriquecida pela notável sensibilidade para as cores: são elas, em seu clima geral, em suas muitíssimas nuances, que evocam as atmosferas sugeridas pelos títulos, certamente colocados a posteriori..”

         Olívio Tavares de Araújo
         “Forma e Cor: Maria Helena Andrés”. Texto escrito por ocasião da exposição realizada na Galeria Grupiara, BH. Estado de Minas, Belo Horizonte, outubro de 1963.         

        
“Nos anos 50 sua obra aproxima-se do Concretismo, mas é na década de 60 que ela realmente assume a liberdade introspectiva da pintura informal, na vertente do abstracionismo lírico.”

         Casimiro Xavier de Mendonça
         Texto do catálogo Pintura Abstrata Efeito “Bienal” 1954-1963 da XX Bienal Internacional de São Paulo - Parque Ibirapuera, São Paulo

        
“Abandonando-se à imaginação, compondo à medida que trabalha, Maria Helena revela grande segurança em seus traços negros, que são como a trama em torno da qual se desdobra a festa de cores.”

         Vera Pacheco Jordão, 1960.

*Fotos de arquivo

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