Konstantin Stanislavski treinava o ator por meio do
autoconhecimento. Para representar o personagem, ele teria que se conhecer,
analisar suas reações, investigar suas ansiedades, seus reflexos, sentir os
impulsos internos e a reação exterior a estes movimentos. Observar-se, situar-se,
perguntar a si próprio: “quais das minhas ideias, desejos, esforços,
qualidades, deficiências e dotes inatos, pessoais e humanos, podem forçar-me,
como homem e como ator, a adotar em relação às pessoas e aos acontecimentos uma
atitude semelhante à do personagem que estou
interpretando?”
Tais
indagações, feitas para o ator se afinar com o personagem, constituíam também
um caminho para a compreensão dos altos e baixos de sua personalidade e de seu
relacionamento com outras pessoas.
Stanislavski fundamentava suas idéias na busca da
realidade interior: “A ação cênica é o movimento da alma para o corpo, do
centro para a periferia, do interno para o externo, da coisa que o ator sente
para a forma física.”
“Só é cênica a criatividade que se fundamenta na ação
interior.”
Toda a sua obra está baseada nesse movimento interno
que se exterioriza. O corpo é o instrumento que irradia os impulsos da alma: o
semblante, o olhar, a mímica, o gesto, as mãos, os pés, a entonação.
O ator tem que compreender esse relacionamento entre
corpo e alma, impulso e movimento, para saber interpretar bem seu papel.
Precisa estar consciente de si próprio, atento a todos os seus movimentos
internos e às suas reações diante dos fatos.
Augusto Boal, autor e diretor teatral brasileiro,
criou o Teatro do Opri-mido, difundido em vários países do mundo. O Teatro do
Oprimido surgiu da experiência de interação com plateias populares e, no dizer
do próprio autor, “pretende libertar o artista que existe dentro de cada um de
nós”.
Boal nos mostra, no seu livro Hamlet e o Filho do
Padeiro: Memórias Imaginadas , como a
experiência no teatro pode tocar níveis mais profundos da personalidade do
ator: o ator pode ser, hoje, Einstein, Chaplin, Gandhi e, amanhã, lixeiro,
coveiro, pária analfabeto. Eu quis dizer – creio ter dito! – que o ser humano é
capaz de mergulhar nas suas profundezas e emergir com personagens
insuspeitados, potencialidades escondidas, submersas na sua recôndita pessoa.
Ser ator significa mergulhar esse mergulho, despertar personagens que borbulham
na panela de pressão do nosso inconsciente.
Na Europa, Augusto Boal desenvolveu trabalhos
interessantes, como o ateliê iniciado em Paris, em 1982, no qual usava técnicas
introspectivas, “um processo terapêutico, mas sem ser terapia”; nenhum dos
participantes tinha mais autoridade do que os outros e todos partiam de um relato individual, uma
história particular que era pluralizada no grupo.
Boal teve oportunidade de estudar, nos EUA, o método
Stanislavski de interpretação. Dentro dessa linha do fazer artístico,
direcionado à busca de si mesmo e da reflexão, o ator estaria desenvolvendo
todo um processo de transformação pessoal, que certamente poderia se refletir
no processo de transformação de seu meio social. (Trecho do meu livro "Os Caminhos da Arte", Editora C/Arte, 2015)
*Fotos da internet
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