Artista plástica, ex-aluna de Guignard. Maria Helena Andrés tem um currículo extenso como artista, escritora e educadora, com mais de 60 anos de produção e 7 livros publicados. Neste blog, colocará seus relatos de viagens, suas reflexões e vivências cotidianas.
terça-feira, 30 de agosto de 2016
EXPERIÊNCIA ARTÍSTICA II
Se a visão de todo
artista é irredutível à visão comum, se ele não pode fugir à sua época ou a seu
tempo, tem no entanto a liberdade de escolha nos múltiplos caminhos a seguir.
A influência tem de vir de dentro, tem de ser espontânea,
nunca imposta por uma circunstância do momento. Se por uma questão de ordem
prática, para alcançar maior sucesso, o artista se abstém de criar o que sente,
deformando a expansão de sua personalidade, para copiar, friamente, a
experiência de outro, sua obra será falsa, inautêntica. Razão pela qual Rilke
convida o artista à solidão, desprezando o que vem de fora. Aconselha-o a
sondar se os alicerces de sua arte se constituem, realmente, de uma
necessidade.
Escreve ele em Cartas
a um Jovem Poeta: "Observe se esta necessidade tem raízes nas
profundezas do seu coração. Confesse à sua alma: 'Morreria se não me fosse
permitido escrever? Isto, principalmente. Na hora mais tranquila da noite, faça
a si esta pergunta: 'Sou de fato obrigado a escrever?' "
Devemos considerar esses conselhos de Rilke como uma
eliminatória para o artista. É um ser ou não ser, onde mediocridade, amadorismo
e passatempo não tem entrada. Muito menos o mito do sucesso, dos aplausos
fáceis.
Talvez o povo se engane quanto a essa exigência da alma do
artista, essa sede de se expressar mesmo sabendo que será criticado depois, de
criar sozinho, sem esperar compreensão e prêmios, apenas para satisfazer ao seu
desejo de absoluto, de infinito.
A arte é o transbordamento deste apelo interior e não, como
pensam muitos, um passatempo que se pode abandonar por tarefas mais úteis. O
mundo materializado e aprisionado à técnica não compreende senão o que tem
recompensa imediata. Para ele, o artista é um extravagante, um louco. E é
justamente realizando as coisas inúteis aos olhos do mundo que o homem se eleva
e se aproxima de Deus, em toda a sua grandeza. As investigações filosóficas, a
arte e a religião não tem sentido utilitarista. Procuram o engrandecimento do
homem e a sua integração mais perfeita no universo a que pertence. (Trecho do meu livro “Vivência e Arte”,
Editora Agir, 1966, já esgotado)
*Fotos de Maurício
Andrés e da internet
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segunda-feira, 29 de agosto de 2016
segunda-feira, 22 de agosto de 2016
EXPERIÊNCIA ARTÍSTICA I
Sobre a experiência artística, temos uma página admirável do
grande poeta que foi Rainer Maria Rilke: "Versos não são, como tanta gente
imagina, simplesmente sentimentos - são experiências: é preciso ver muitas
cidades, homens e coisas, conhecer o voo dos pássaros e o gesto das flores,
quando se abrem pela manhã; voltar em pensamento aos caminhos das regiões
desconhecidas, aos encontros inesperados, às separações já de longe previstas,
às doenças da infância carregadas de profundas e graves transformações, aos
dias fechados ou de sol, às manhãs de vento ao mar, às noites de travessia e de
fuga. E tudo isto não basta. É preciso, também, as memórias das vivências
passadas e mesmo estas não bastam. Pois é preciso também saber esquecê-las,
quando são muitas, e ter-se a imensa paciência de esperar que voltem novamente.
E, quando então tudo tiver retornado dentro de nós, como o sangue, a brilhar e
a gesticular sem se distinguir de nós mesmos, só então pode acontecer que, na
hora rara, a primeira palavra de um poema se levante no meio daquelas
experiências e delas prossiga."
A descrição do processo poético, de Rilke, pode aplicar-se a
qualquer outra arte.
Consideremos o artista plástico diante de sua tela ou da
folha de papel em branco.
Ao escolher uma cor ou preferir uma linha, o artista revela
ao mundo parte de sua vida. Alguma coisa que lhe pertencia, exclusivamente, se
faz partilhar naquela forma nova, criada por ele.
São suas paixões, seus dramas. São suas primeiras impressões
de infância, o despertar para o mundo, as inquietações da adolescência, os
sonhos e arrebatamentos da mocidade, a plenitude da idade madura. É a alegria
do primeiro filho que nasce, as noites de vigília à beira do berço, a
capacidade humana e natural de poder dar-se a alguém.
A arte não é incompatível com as coisas simples da vida. E,
para ser artista, não é preciso viver de um modo extravagante e original. Não é
preciso vestir-se excentricamente e andar pelas ruas de madrugada em rodas
boêmias, embora a arte não exclua qualquer experiência.
A vivência artística é a realidade de uma vida interior
intensamente vivida, onde os acontecimentos grandes e pequenos, originais ou
rotineiros, tem um valor eterno.
É indispensável que este mundo interior exista, para que
haja criação autêntica. É indispensável que exista esta integração perfeita das
experiências com a vida do artista. Que elas façam parte do seu sangue, como
diz Rilke, para que mais tarde frutifiquem como obra de arte. A mão que traça
uma linha e mistura uma cor não estará praticando um gesto vazio de sentido,
mas realizando o que sua experiência exigiu de um modo particular e sincero.
A escolha das cores e formas é espontânea e identifica cada
artista, traduzindo sua personalidade.
É inútil tentar forçar determinado artista a abandonar os
seus meios honestos, sinceros, de expressão, por outros mais avançados, mas não
correspondentes, exatamente, ao seu temperamento e às suas exigências. Uma
forma nasce da contemplação de outra forma, da identificação de sensibilidades
e esta identificação tanto pode ter raízes populares quanto intelectuais.
(Trecho do meu livro “Vivência e Arte”, Editora Agir, 1966, já esgotado)
*Fotos da internet
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terça-feira, 9 de agosto de 2016
SURPRESAS DE UM ANIVERSÁRIO
Um encontro do Oriente
– Ocidente, através da arte, aconteceu em minha casa no Retiro das Pedras na
manhã de 31 de julho.
Organizado por Luciano Luppi e Ivana Andrés, a
programação teve início com uma homenagem ao poeta indiano Paranjape Makarand
que,em Brasília, lançou um livro com poemas sobre o Brasil, com ilustrações de
minha autoria na capa e contracapa. Ivana leu um trecho do livro, que faz
referência à artista Maria Helena Andrés num encontro com o poeta há alguns
anos atrás. Em seguida, Henrique Luppi interpretou outro poema, dessa vez com
impressões gerais do poeta sobre o Brasil. Para ele, o Brasil pode ser
considerado o coração do planeta, a Índia o espírito, e a Europa e os EUA a razão. Luciano Luppi interpretou outro
poema de Makarand, “Porque somos um Rizoma”, além de um poema de Tagore.
Em seguida
Alexandre Andrés cantou “A voz de todos nós”, em minha homenagem, um grande
presente para o meu aniversário.
Finalmente aconteceu um recital de música indiana,
realizado por Helder Araujo.Helder estudou na Índia com mestres da música na
cidade de Benares, a cidade mais antiga da Índia, à beira do Ganges.Trouxe para
nós uma apresentação devocional, tocando a cítara, instrumento tradicional da
Índia.
Escutávamos em silêncio os acordes daquela música e
me foi possível relembrar a Índia e seus músicos sentados no chão em tapetes.
Estava absorta nas minhas lembranças, trazendo a
música da Índia para o Brasil, escutava a música da Índia em solo brasileiro,
quando espontaneamente, sem nenhum ensaio preliminar, o som de uma flauta
começou a fazer duo com a cítara do Helder. Artur Andrés nos proporcionou uma grande
surpresa. Foi grande a emoção que sentimos naquela apresentação, a fusão de
duas culturas, de terras irmãs separadas por muitos mares.
A música é de todas as artes a que mais emociona e o
encontro Oriente – Ocidente feito espontaneamente numa festa de celebração dos
meus 94 anos foi realmente um presente vindo do alto.
Ali se encontraram a poesia, a literatura e a música
indicando novos caminhos no processo de integração planetária.
Naquele ambiente impregnado de muitas lembranças,
onde e, por muitos anos criei meus quadros, estavamacontecendo naquele momento
novas versões da arte que aproximavam o mundo ocidental do mundo oriental.
À tarde, no meu atelier situado no andar superior da
casa, um grupo de crianças promoveu espontaneamente uma escolinha de arte. Meus
bisnetos também participaram da festa e me deixaram um registro maravilhoso de
desenhos infantis.
*Fotos de Maurício Andrés
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segunda-feira, 1 de agosto de 2016
ARTE NAS RUAS II
“Paralelamente aos happenings e à arte de denúncia,
começaram a surgir manifestações
coletivas abertas à participação do público.
Iniciativas como Arte na Rua, proposta por Hélio
Oiticica, e Arte Pública no Aterro, organizada por Frederico Morais e Oiticica,
abriram espaço para qualquer pessoa se expressar criativamente. No Museu de
Arte Moderna do Rio de Janeiro, manifestações de arte coletiva emergiam
incentivadas pela mídia.
Os Domingos de Criação eram uma festa de arte, onde
todos podiam colaborar.
Um novo sentimento poético emergia do povo, as
manifestações coletivas levavam à
descoberta de novos valores. A denúncia cedeu lugar ao prazer de criar e
compartilhar. Havia a necessidade de usar a criatividade para buscar a paz,
numa sociedade conturbada pela violência.
A partir da década de 1990 a arte se dirigiu para
uma comunicação mais alegre com o povo. Espetáculos circenses foram realizados
nas ruas, com a participação do espectador. Grupos também se reuniram nas
praças, celebrando as danças circulares pela paz universal.
Essas manifestações coletivas buscavam, antes de
tudo, unir as pessoas dentro de um clima de solidariedade e confraternização. A
arte nas ruas veio trazer o lúdico ao transeunte apressado das grandes cidades,
em momentos de descontração oferecidos gratuitamente.” (trecho do meu livro “Os
Caminhos da Arte”)
No século XXI surgiram os eventos denominados “flash
mobs”. São ações inusitadas que congregam toda a população presente e que
acontecem em geral em terminais rodoviários e estações centrais de cidades em
vários países ao redor do mundo.
O flash mob durante a Jornada Mundial da Juventude
no Rio, realizado na praia de Copacabana foi considerado um dos maiores do
mundo.
Em 2014, em Bangladesh, grupos de dança se
apresentaram nas ruas, formando rodas, sob aplausos da população.
Em 2009, na Union Square, Nova York, os Elfos Doidos
se apresentaram em público durante o Natal, uniformizados.
A dança continua a unir as pessoas e a fazê-las
participar de eventos criativos.
O flash mob na Estação Central em Estocolmo foi um tributo a Michael Jackson, pouco depois de sua
morte.
Por ocasião da inauguração do Circuito Cultural da
Praça da Liberdade em Belo Horizonte, um flash mob levou dançarinos e público a
cantarem juntos a música “O que é, o que é” de Gonzaguinha.
Essas danças de rua, que acontecem simultaneamente
em várias partes do mundo, com a participação da comunidade, são criadas por
grupos de jovens dançarinos e movimentam toda uma população em torno da arte.
Podem ser consideradas como arte política, cuja
finalidade é romper os condicionamentos e despertar o lúdico, mudando os
valores de uma sociedade massificada e repetitiva.
*Fotos da internet
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