Transcrevo abaixo trecho do meu livro “Os caminhos
da Arte”, que aborda a Vanguarda Russa, precursora do Movimento Construtivo
Brasileiro, numa síntese com a antiga sabedoria do mundo, incluindo os
Upanishads:
No panorama histórico da arte moderna, o
Abstracionismo não foi apenas uma tendência a mais, foi uma revolução dentro da
arte. Quebrou-se todo um condicionamento que de certo modo acompanhou a
evolução da arte desde a Idade da Pedra até os tempos modernos: o de perceber e
reproduzir imagens do mundo real. Reivindicou-se a libertação da forma do seu
conteúdo realista.
Na Rússia pré-revolucionária, Nathalie Gontcharova
e
Michel Larionov
apresentaram as primeiras telas rayonistas, nas quais a cor
buscava a mesma independência do som. A libertação da cor e da forma de
qualquer significado real, a ideia de que têm vida própria, marcou o início de
uma série de caminhos na arte moderna. Dentro dessa mística, a vanguarda russa,
entre 1910 e 1920, teve um papel fundamental. Poetas e pintores aliaram-se em
torno das novas ideias. A liberdade pleiteada pelos artistas significava, antes
de tudo, um desligamento de pressões externas, dos cânones e padrões
tradicionais.
Maiakovski, na poesia, Malevitch, Kandinsky,
Tatlin,
El Lissitzki,
Naum Gabo
e Pevsner,
nas artes visuais, tornar-se-iam os líderes
do novo movimento, gerador de várias correntes estéticas não figurativas.
Malevitch
procurava no suprematismo a essência do
sentimento humano. Sua pintura, inteiramente despojada de elementos orgânicos,
libertou-se do objeto, buscando na sensibilidade em seu estado mais puro o
encontro com o Supremo. Malevitch propunha uma arte desinteressada,
inteiramente subjetiva. Gabo e Pevsner, em seu Manifesto Realista , protestavam
em favor de uma arte independente. A busca de uma nova realidade, o sentimento
de ausência do objeto, o encontro com a essência das coisas motivaram o grupo
de vanguarda em torno do Construtivismo e também de uma nova visão da
realidade.
Se para Pevsner e Gabo o ideal era a formação de uma
nova sociedade, para Malevitch a verdadeira realidade da vida e da arte
encontrava-se nessa busca do Supremo por meio da ausência de cores, da pureza e
da sobriedade de formas. Sua arte buscava o vazio e a não objetividade. Branco
sobre Branco,
seu último quadro, enfatizava a absorção da forma na totalidade
do Ser, que é impessoal e sem forma. O caminho proposto por Malevitch
mostra-nos o fim da manifestação fenomenal e a entrada em outro plano, onde
qualquer manifestação exterior significa descer ao mundo da multiplicidade. O
branco é a fusão de todas as cores, sem fragmentações. Em Malevitch, a
espiritualidade da Arte Abstrata encontra seu ponto máximo. Formas e cores
desaparecem para dar lugar à claridade e à pureza suprema que é o
Branco sobre Branco.
A busca espiritual desses pintores russos nos remete
às fontes orientais da filosofia perene das
Upanishads.
O conceito fundamental do Hinduísmo é que, por
detrás da multiplicidade de formas do mundo imanente, existe uma Causa
Primeira, imutável, inimaginável, sem atributos. Esta é Brahman
e Atman (correspondendo
respectivamente à abordagem objetiva e subjetiva).
O Ser impessoal ou o Supremo, ao qual Malevitch se
refere, corresponde a Brahman, o Criador
do universo, aquele que está presente neste nosso mundo, com sua multiplicidade
de formas, e ao mesmo tempo o transcende.
Atman, da mesma natureza de Brahman, é a sua
abordagem subjetiva, ou a Centelha Divina inerente a cada um de nós. (trecho de
“Os Caminhos da Arte”, 3 Edição, Editora C/Arte, 2015)
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