Artista plástica, ex-aluna de Guignard. Maria Helena Andrés tem um currículo extenso como artista, escritora e educadora, com mais de 60 anos de produção e 7 livros publicados. Neste blog, colocará seus relatos de viagens, suas reflexões e vivências cotidianas.
segunda-feira, 19 de junho de 2017
ESCUTAR O CORPO
Dizem
que a casa
É
o corpo
Outros
falam
Que
o corpo é a casa.
Eu
simplesmente
Paro
E
escuto a voz do meu corpo.
Ele
fala de mansinho
Ninguém
escuta
Mas
eu sinto
O
desconforto
De
uma tinta
Já
mudei do óleo
Para
o acrílico
Cortei
a cor.
Cortei
o gesto agressivo
Movido
pela emoção
De
sentir coisas
Erradas
acontecendo
Ou
o gesto vagaroso
Sensual
ou sensível
De
madrugadas violetas
Das
flores se abrindo
Dos
poentes vermelhos
Laranjas,
rosas, verde bem claro
Azul
violeta, amarelos
Cidades
imaginárias
Castelos
nas nuvens.
O
corpo sente, se emociona
E
chora
(Escuto
a voz da Ivana cantando
“Solamente una vez”
E
me lembro do Luiz
Ele
incentivava os filhos
A
serem artistas
E
todos são artistas)
Volto
ao corpo
Ao
ouvir a música do filho e do neto
A
flauta chega aos ouvidos
Chega
aos olhos
Chega
às mãos
A
tinta entra pelas
Unhas,
entra no corpo
O
amarelo cádmio
Azul
de cobalto
Cores
venenosas.
Meu
corpo sentiu
Parei
de usar cores
Entrei
na dieta do
Preto
e branco
Que
era mais fácil
Mais
direta.
A
emoção chegava
Diretamente
vinda do
Pincel
ou da esponja.
Esponja
de pedreiro
Escovão
de faxineira.
Entrei
para uma
De
dona de casa e artista.
Pincéis?
Nunca
mais!
Apenas
o preto e o branco.
Lembrei-me
da minha
Fase
de papel veludo
Sempre
pintada nas
Viagens
pela América.
Fizeram
tanto sucesso!
Acabaram
com o tempo...
Agora
ressurgiram de outra forma
Pintar
com esponjas
É
mais direto, mas a
Tinta
entra pelos dedos.
Meus
dedos doem
Meu
corpo dói.
“O
corpo fala”, dizia
Pierre
Weil.
Sim,
o corpo fala
Já
dói nas costas
Os
dedos sentem.
Parar
de pintar?
Não.
Parar
de usar tintas
Que
poluem.
Voltar
aos tempos do
Desenho
em nanquim
Nos
pequenos cartões.
Vou
me distraindo e o tempo vai passando.
Vou
desenhando sem parar
Tudo
pequeno
Distribuo
os desenhos.
Não
vendi nenhum!
Volto
aos tempos
Em
que eu desenhava
Sem
parar
Seguindo
simplesmente
O
desejo de criar.
De
repente percebo que as
Mãos
doem, as costas também.
Vou
ter que parar?
Nunca!
Vou
fazer outras coisas
Com
as mãos
Pobres
mãos...
Não
podem ficar à toa
Contemplo
as montanhas
Olho
a paisagem
É
a minha forma de
Meditar
– ver, observar, sentir
Depois
volto ao trabalho.
Só
uso papel.
Sinto
falta das cores
Uso
papel colorido
Deixei
os pincéis, as esponjas
As
tintas.
Agora
é a tesoura e o
Papel
Só
recorto e colo.
Às
vezes faço esculturas de papel
Brancas,
pretas, coloridas.
Vou
produzindo.
Quando canso,
descanso.
Assim
é a vida.
Sentir
o corpo
Ele
fala conosco
“body
talk”
Não
é que dá certo?
O
corpo fala, adivinha, alerta.
Escuto
a voz do corpo, é sempre a direção
Mais
certa.
As
mudanças não
Importam,
acontecem.
A
vida é uma constante mudança
Vou
seguindo a voz
Do
corpo até um dia
Parar.
*Fotos
de arquivo
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segunda-feira, 12 de junho de 2017
UMA PEQUENA HISTÓRIA DE VIDA E ARTE II
Dando continuidade a esta pequena história, revejo
quadros da minha trajetória artística
expostos nas paredes da casa do Maurício.
Em um dos quartos há uma “Via Sacra”, que foi um
projeto para a ermida da Serra da Piedade; em outro um quadro da minha fase de
astronautas.
Representando a fase construtivista, vejo nas
paredes da sala uma das minhas “Cidades Iluminadas”, pintado em 1955 e que já
correu Salões no Rio de Janeiro e Bienais em São Paulo. Essa fase é atualmente
muito solicitada, procurada por colecionadores e marchands.
Olhando para outro quadro, lembro-me da minha fase
de astronautas, exposta no Rio de Janeiro em 1969, no mesmo dia em que o Homem
pisava pela primeira vez na Lua. Fui procurada naquela ocasião por diversos
jornalistas que indagavam como eu poderia ter pintado paisagens lunares muito
antes delas aparecerem na televisão. Vejo nesse quadro um foguete sendo lançado
e uma nave espacial cheia de habitantes, em busca de outras “Terras”. Eu ouvia
naquela época, incessantemente, as músicas de Frank Sinatra. Um dia cansei de
tanto repetir o esmo LP e decidi colocar Frank Sinatra dentro de uma nave
espacial para cantar em outros planetas...
Na sala há também um quadro da minha fase de
“Mandalas”, todo em rosa. Os meus quadros de Mandalas foram feitas para
finalizar todas as fases. Mandala sempre representa um círculo em que todas as
faces são iguais. É um símbolo de integração, e
eu, naquela época, estava integrando todas as minhas fases, para começar
a pintar em grandes espaços. Os painéis surgiram exatamente depois das
Mandalas. Mandala é um símbolo cósmico muito usado pelos orientais em suas
meditações. Os cristãos também adotam a forma circular, nos vitrais de
Chartres, Notre Dame e vários outros.
Há também na sala desta casa um desenho grande
representando um veleiro. Minha fase de “Barcos” durou muitos anos e me
incentivou a realizar minhas viagens pelo mundo. Meus desenhos gestuais
nasceram daquele gesto espontâneo, feito sem nenhuma premeditação. Foram uma
consequência dos meus primeiros “veleiros”, desenhados sobre papel veludo, com
a quina do carvão para obter transparências. Muitas vezes, em minhas viagens,
foram desenhados em cima do meu próprio colchão de dormir ou sobre o tapete do
meu quarto de hotel. Fiz uma série deles nos EUA e continuei essa série no
Brasil, substituindo o carvão pela esponja de pedreiro ou pelo escovão da
faxineira.
O meu passado foi muito prazeroso, eu sempre gostei
de pintar.
Pintei a vida toda, até que a tinta passou a me
perturbar.
Hoje faço colagens, não uso mais tinta. Não preciso
de fazer esforço para pintar grandes espaços, reduzi o tamanho dos quadros, não
uso tintas e pincéis, só a tesoura e a cola. Matisse também, depois de certa
idade, passou a fazer colagens. O importante é estar sempre ocupada, sempre
produzindo algo novo, ao sabor do momento. Foram vários momentos variados como
a vida, seguindo o próprio caminho, registrando histórias. Cada quadro guarda
uma memória diferente e agora, aos 94 anos, consigo me lembrar do que eu sentia
na ocasião em que pintava cada quadro.
São experiências, registros da minha passagem pelo
Planeta, em busca de um caminho.
Arte e Vida andam juntas, sempre andaram, não é
necessário fazer performances demonstrando que a arte e a vida são uma coisa
só, é impossível separá-las. Minha vida de artista está registrada na arte, nas
paredes e nos muros, nas tapeçarias.
Em 2000 houve um ponto
de mutação na minha arte, que saiu das paredes buscando uma terceira via, a via
tridimensional. Saíram para o 3D com ajuda do computador. Hoje ganham formas
arredondadas, projetadas no papel em tiras coloridas.
O importante é seguir o próprio caminho. Vou
seguindo o meu itinerário até que Deus me chame para outra dimensão. A arte é
uma das maiores formas de sentirmos felicidade aqui na Terra. Registrando
sentimentos vamos seguindo pela vida. Até quando? Não sei.
*Fotos de Maurício Andrés Ribeiro
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segunda-feira, 5 de junho de 2017
UMA PEQUENA HISTÓRIA DE VIDA E ARTE I
Estou descansando na casa do meu filho Maurício, em
Brasília, revisitando o meu itinerário artístico. A minha primeira fase ali
está, distribuída nas paredes da sala. Vejo em minha frente o primeiro barco,
pintado em 1944, há 80 anos atrás!
Os anos foram passando mas os temas dos meus quadros
se repetem, se transformam, retratam uma época feliz, as paisagens do mar, da
cidade e da zona rural, uma constante em meu itinerário.
O barco simboliza
viagens e eu, desde aquele tempo, já antecipava minhas viagens. Muitos quadros
dessa primeira fase ficaram na fazenda da Barrinha, onde tive um atelier rural
na década de 60. Me lembro do dia em que meu cunhado Camil Caram veio me
entregar este pequeno barco.
“Este quadro é histórico, deve ficar com um dos seus
filhos”.
Realmente, ele está muito bem guardado com Maurício
e Aparecida. Bem guardado e bem situado.
Logo em seguida vou percorrendo nas
minhas lembranças outro quadro, pintado na mesma época. É uma lembrança do meu
quarto de solteira. Da minha janela eu registrei nesse quadro a paisagem que eu
via em minha frente, a cidade de Belo Horizonte em 1944. Naquela época não
existiam prédios altos em BH. Vejo no quadro um pedaço do Colégio Sagrado
Coração de Jesus, telhados e mais telhados, o Colégio Padre Machado, muitas
árvores e o céu de Minas se estendendo sobre as casas. Eu pintava paisagens e
marinhas, depois voltava para o atelier da Escola no parque para pintar a nossa
sala de aula com os alunos e alunas trabalhando. Guignard tinha uma assistente,
Edith Bhering e eu consegui retratá-la atrás de uma aluna, corrigindo um
quadro. Um voo pelo passado me reconduz ao tempo em que eu frequentava a escola
e estava me libertando do academismo, para abraçar o modernismo.
Eu estudava na Escola Guignard quando conheci meu
marido Luiz Andrés. Ele gostava de arte, antes de me conhecer conheceu meus
quadros numa exposição. Naquela exposição, Luiz estava em companhia de seu
amigo, o professor de filosofia, padre Orlando Vilela que naquela ocasião
escrevia sobre arte. Seu livro,
“Realidade e Símbolo”, baseado nas ideias de Jacques Maritain era o meu livro
de cabeceira da época, bem como “Cartas a um jovem poeta” de Rainer Maria
Rilke.
Quando nos conhecemos, estudávamos juntos a
filosofia de Maritain, assim como os poemas de Rabindranath Tagore, Paul
Claudel e Murilo Mendes. Desde essa época, acompanhada por Luiz e sua irmã,
Lourdes Resende, comecei a refletir sobre Arte e Espiritualidade. Dali nasceram
os primeiros capítulos do meu livro “Vivência e Arte”, editado pela Agir em
1966. Naquela ocasião, eu participava de um grupo de jovens católicos chamado
“Grupo da Vigília”, onde me convidaram para fazer palestras sobre Arte e
Espiritualidade.
Depois de casada passei a frequentar a fazenda do meu
sogro, perto de Entre Rios de Minas. Paisagens do interior, com festas juninas,
casamento na roça e vários motivos rurais vieram povoar o meu imaginário de
artista.
A alegria e a descontração de uma festa junina
serviu de inspiração para outro quadro, que estou vendo na mesma sala.
Guignard gostava de festas juninas, balões voando
pelo céu. A minha festa junina é um registro de festas populares muito comuns
no interior.
As crianças me acompanhavam enquanto eu pintava e
algumas vezes eram incluídas nos meus quadros. Gostavam de brincar no fundo do
quintal com as galinhas e os cachorros da fazenda.
*Fotos de Maurício Andrés Ribeiro
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