sexta-feira, 3 de setembro de 2010

PIC NIC NA FAZENDA

Comer é um ato agrícola - saber a origem dos alimentos, como são plantados, se são preservadas as comunidades tradicionais de plantio, enfim, preservar os saberes e sabores. Unir os dois elos: produtor e consumidor e integrá-los num ambiente de arte do cotidiano em que os pratos servidos são coloridos.
Junto com o grupo local do “Slow Food” os visitantes são convidados a participar de um evento, uma festa no campo onde recebem instruções sobre o plantio dos alimentos que consomem.
No almoço o prato fundamental foi o bambá de couve, angu e farinha de milho torrada. Receita de Jorge dos Anjos que é artista e “gourmet”. Às vezes é convidado para expor suas esculturas e acaba fazendo o almoço.
Teresa recebeu uma receita do Chico Magalhães, artista plástico e atualmente diretor do Museu Mineiro de um biscoito amanteigado de fubá, denominado pelos antigos de “raivinha”. Numa oficina de gastronomia com as crianças, Teresa as incentiva a meter a mão na massa.
A raivinha era usada pelas mães como tarefa de harmonização das brigas entre irmãos. Enquanto amassavam os biscoitos punham a raiva para fora. Depois comiam a produção celebrando as pazes. Isto se chama o saber dos sabores.
O pique-nique incluía em sua programação uma visita à horta para ver a plantação de morangos, das hortaliças e do milho. As crianças identificavam as mudas. A festa terminou com uma visita à fazenda da Barrinha, para ver o moinho dágua e os jardins da tia Laura, cheios de bouganviles, orquídeas e até o perfumado “chulé do imperador”.
Uma jovem artista americana relacionou os jardins da Barrinha com os “secret gardens” nos USA. Lembramos também dos jardins de Monet, que ele imortalizou nos seus quadros.
O tema do pique-nique era o “milho”, o estudo de seu plantio e aproveitamento. Foi mostrada a palha usada pelas artesãs locais na criação de bonequinhas, cestos, flores etc. O milho também conduziu os convidados a ver o moinho d’água na Barrinha.
Na fazenda da Barrinha eu tive meu ateliê durante 20 anos e ali pintei várias fases do meu itinerário artístico. A fase de guerra, as madonas e a fase cósmica.
Daquele lugar privilegiado eu continuo guardando as melhores lembranças e revendo a janela do meu ateliê agora colorida com bouganvilles em flor.

Vejo agora os meus filhos e netos cultivando a terra herdada de seus avós e bisavós, como uma forma ecológica e sustentável de reverenciar a natureza. Ao mesmo tempo proporcionam às crianças o conhecimento de uma alimentação sadia, necessário para transformar o “fast food” em “slow food”.

Esta é uma forma de estender a arte à vida, proposta do nosso mundo contemporâneo.
Estamos vivendo uma época de grandes transformações e uma das funções mais importantes das diversas formas de arte é colaborar com esta mudança da sociedade. A arte do momento liberta-se, aos poucos, dos antigos padrões do passado, do mito do sucesso, da valorização da mídia, da ambição material, para conduzir o ser humano à sua real posição no planeta, à sua ligação com a natureza e com o universo.
Arte e vida não estão separadas, mas coexistem de forma harmoniosa quando tudo é feito com reverência e atenção. As atividades do dia-a-dia, a cozinha, a jardinagem, o arranjo de flores, o cuidado com as crianças, tudo está na extensão da arte para a vida.

*Fotos de Euler Andrés e Cristina Cortez

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