Belo Horizonte era cidade jardim. Na Avenida Afonso Pena uma fileira de árvores verdes possibilitava ao transeunte um descanso saudável nos dias de calor. Os bondes subiam e desciam conduzindo passageiros e parando nos abrigos. O abrigo mais próximo à minha casa era o abrigo Ceará. Descíamos do bonde naquela parada e íamos subindo até a nossa casa, correndo debaixo das árvores. As minhas memórias de BH estão ligadas às imagens dos bondes, das flores e das árvores. Até hoje não sei porque retiraram os bondes de circulação e decapitaram as árvores. Em todos os países do primeiro mundo os bondes continuam circulando e trazendo grandes benefícios para a população sem os efeitos colaterais da gasolina. Acho que a retirada dos bondes e das árvores tem muito a ver com a circulação dos carros.
Assisti ao primeiro sacrifício das árvores. Fiquei da janela registrando a cena, sentindo a tristeza de ver a cidade despojada, descontruída, famílias pobres carregando a lenha para o fogo. Conservo desenhos da época, como recordação do evento. Belo Horizonte perdia a característica de ser a cidade jardim, famosa pelo perfume dos jasmins e damas da noite. Aquelas árvores enormes copadas, adequadas ao efeito estufa, só restam como recordação da época na Avenida Bernardo Monteiro. Assim, ficamos por muito tempo, mergulhados no asfalto cinzento e na verticalização da cidade.
Muitos anos se passaram. Aos poucos, fui percebendo que Belo Horizonte estava tomando cores novamente e as flores renasciam nas alamedas e praças. Tomei a minha câmera digital, chamei um táxi e fui fotografar os ipês da praça da Liberdade que estavam em plena floração. Perguntei a quem me acompanhava: “O que você está achando de eu tomar um táxi só para fazer fotos na praça?”. Ela respondeu: “Isto e porque você está de bem com a vida!”
Agora, sentada no café do Palácio das Artes converso com uma arquiteta sobre a beleza dos ipês. Ela vai falando e eu escutando. “Você talvez não saiba, mas esses ipês tão floridos foram idealizados por seu filho Maurício, quando era secretário de meio ambiente. Na época, o projeto foi considerado visionário, mas hoje os resultados são visíveis.”
O plantio de árvores foi feito levando-se em conta as diferentes épocas de floração, para que a cidade pudesse estar sempre florida. A Praça da Liberdade é hoje um dos lugares mais aprazíveis da cidade e ali acontecem eventos criativos de dança e música, além de projetos na área de ecologia e tratamentos alternativos de saúde. Dentro de um stand, o jovem ambientalista mostra o seu trabalho realizado em Sete Lagoas. Outro stand demonstra massagens, acupuntura e terapias orientais.
Lembro-me da praça à noite, todos os domingos quando ali os jovens faziam footing, moças caminhando e os rapazes parados em grupos cortejando as suas eleitas. No tempo da minha mãe os pretendentes passavam de bonde e tiravam o chapéu em frente à casa da namorada que estava na janela, esperando o bonde passar.
Hoje, na Praça da Liberdade, na semana da dança, o povo dança em cima de um tablado, dança de salão, do samba ao bolero. É a dança a dois que mais cresce em Belo Horizonte. Para praticá-la basta gostar. A dança na rua faz parte também da programação da cidade de Buenos Aires, na Argentina. Ali o visitante pode admirar um tango bem dançado e também participar.
Hoje Belo Horizonte volta a ser a cidade jardim, os ipês vão florindo de forma sustentável, quando um acaba de florescer o outro começa. “Em setembro, teremos os ipês amarelos”, nos disse o motorista de táxi. Eles rodam a cidade e dão notícia de tudo, das flores, das festas, das danças. Hoje, é dia de festa na praça e para lá nos dirigimos com a nossa pequena câmera fotográfica.
* Fotos: Maria Helena Andrés
Nenhum comentário:
Postar um comentário