terça-feira, 18 de novembro de 2014


DOM EUGÊNIO SALES E AS TAPEÇARIAS DE N.SRA DE COPACABANA

Cerca de 6000 fiéis acompanharam, há alguns anos,  o velório de Dom Eugênio Sales no Rio. Uma pomba branca, símbolo do Espírito Santo, pousou sobre o caixão e ficou durante toda a tarde perto do corpo. Dom Eugênio morreu tranquilamente enquanto dormia, uma morte serena de quem seguiu seu caminho ajudando os fiéis e praticando a justiça.
Durante o regime militar ele, como chefe da Igreja Católica, ajudou perseguidos e refugiados políticos a saírem do país.
“Estima-se que 4000 a 5000 pessoas tenham recebido ajuda do então cardeal arcebispo do Rio para fugirem.” Fui acompanhando pelos jornais, especialmente a Folha de São Paulo, as notícias referentes  a Dom Eugênio e relembro a sua atuação justa e coerente diante de outros fatos, não políticos. Na década de 1970, recebi a encomenda de realizar 3 projetos de tapeçaria para a Igreja N. Sra de Copacabana, no Rio de Janeiro. O projeto era de grande responsabilidade e eu, como artista, me empenhei de corpo e alma na sua realização. As tapeçarias foram executadas no Rio por minha prima Maria Ângela Magalhães que ali dirigia um artesanato da mais alta qualidade. Maria Ângela, com seu talento artístico, interpretava os projetos transformando a técnica do pastel no bordado. Ela mesma tingia as lãs e orientava as bordadeiras. As tapeçarias da Igreja eram enormes, duas para a nave principal e outra, também monumental, para a capela ao lado. Tudo isto foi feito com muito amor e dedicação. Resolvi não cobrar da Igreja: “Meus projetos são de graça!” isto foi declarado na época, mas o cardeal, que liderava as reuniões, não concordou com a minha resolução. “Todos os outros artistas cobraram, esta artista precisa receber também.”
Decidiram me enviar um cheque com o valor dado pela equipe de produção.
Por incrível que pareça, esta atitude do cardeal me possibilitou realizar a minha primeira grande viagem à Índia.
Naquela ocasião eu não tinha recursos para as passagens, foi de grande importância para mim a decisão que foi tomada.
Até hoje relembro com muita gratidão este fato e costumo repetir: “Foi o cardeal arcebispo do Rio de Janeiro, Dom Eugênio Sales que me possibilitou realizar a minha primeira grande viagem à Índia.” Agora posso dizer que o cardeal me deu a oportunidade de iniciar um diálogo inter religioso.

*Fotos de arquivo e da internet


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terça-feira, 4 de novembro de 2014


OUTRAS PESSOAS, SER OU NÃO SER

No dia 25 de outubro de 2014 tivemos uma surpresa. Luciano Luppi, o nosso talentoso ator, interpretou poemas de Fernando Pessoa no espetáculo "Outras Pessoas, ser ou não ser."
Lembrei-me novamente da Índia.
“Este é um lugar sagrado de arte, deixem as preocupações do lado de fora”, dizia um cartaz à porta de uma sala de dança no sul da Índia.
Realmente estávamos preocupados, alias o Brasil estava preocupado e corria por todo o lado o mesmo assunto – política.
A recomendação de silêncio e reverência completa à arte cênica não precisava de palavras. Ali estava o cenário, como uma advertência.
Foi realmente impactante aquela figura imensa, vestida de túnica escura, com uma máscara branca e luvas brancas. Confesso que fiquei assustada, pois não esperava aquele primeiro choque. Não foi preciso dizer que a turma de espectadores foi se assentando devagar, sem fazer barulho. Dali em diante o espetáculo transcorreu com a maior seriedade, a palavra acrescida e transmutada ao sabor da interpretação. Textos de Fernando Pessoa e Shakespeare foram de certo modo o roteiro daquela viagem para um mundo além dos interesses conflitantes do presente.
 O silêncio foi necessário e aconteceu. As palavras de Fernando Pessoa, o grande poeta português, foram nos dirigindo para caminhos desconhecidos que só a arte pode desvendar. Ali as palavras não estavam somente guardadas dentro de livros. Elas estavam vivas na interpretação  de Luciano e tocavam o público como uma música. Ivana acompanhava os textos operando uma trilha sonora condizente com a peça, despertando e conduzindo as emoções da platéia.
Realmente o silêncio era necessário, para que as palavras do poeta português ecoassem por nossas montanhas.
No final, Luciano veio me oferecer o seu trabalho, como um presente para  o IMHA, agora com nova sede no Retiro das Pedras.
Marília, como presidente, agradeceu a generosidade dos artistas.
Este voluntariado, totalmente desapegado de patrocínio, é uma benção que será aplaudida por todos nós.
Este é o nosso agradecimento .
Segue abaixo trecho de um poema de Fernando Pessoa:
“Para ser grande, sê inteiro:
Nada teu exagera ou exclui.
Sê todo em cada coisa. Põe quanto és
No mínimo que fazes.
Assim em cada lago a lua toda
Brilha, porque alta vive.

Sob a leve tutela
De deuses descuidosos,
Quero gastar as concedidas horas
Desta fadada vida.

Nada podendo contra
O ser que me fizeram,
Desejo ao menos que me haja o Fado
Dado a paz por destino.

Na verdade não quero
Mais que a vida; que os deuses
Dão vida e não verdade, nem talvez
Saibam qual  a verdade”

*Fotos de Ivana Andrés, Henrique Luppi e Maurício Andrés


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