Artista plástica, ex-aluna de Guignard. Maria Helena Andrés tem um currículo extenso como artista, escritora e educadora, com mais de 60 anos de produção e 7 livros publicados. Neste blog, colocará seus relatos de viagens, suas reflexões e vivências cotidianas.
terça-feira, 19 de agosto de 2014
IGNACY SACHS, PIONEIRO NA COOPERAÇÃO ÍNDIA - BRASIL
Recebi de
Maurício Andrés Ribeiro o texto abaixo que nos mostra com muita clareza a
importante missão de estreitar o intercâmbio Oriente-Ocidente e, de modo
especial Brasil e Índia. Maurício nos lembra neste artigo a presença de Ignacy
Sachs que, na década de 50 iniciou este intercâmbio.
“Nos idos de 1977, quando pus os pés na Índia pela
primeira vez, sabia que percorria caminhos que Ignacy Sachs trilhara, pioneiramente, nos anos 50. Sou
grato a ele pelas orientações e pelas
valiosas referências que me ofereceu desde então. Sinto-me em ótima companhia
filosófica e intelectual, que me estimula a prosseguir no caminho das Índias.
Ignacy
Sachs é socioeconomista, nascido na Polônia e naturalizado francês. Viveu
quatorze anos no Brasil, dirigiu o Centro de Pesquisas sobre o Brasil
Contemporâneo na Escola de Altos Estudos em Ciências Sociais de Paris. Doutor
pela Universidade de Delhi, na Índia, durante mais de 65 anos Ignacy
Sachs trabalhou para a cooperação Brasil-Índia. Em uma entrevista,
impressionado com a independência da Índia em 1947, perguntava: “Como um
país colonizado consegue se livrar da dominação do maior império colonial do
mundo quase sem derramamento de sangue? A mensagem é absolutamente
extraordinária.”(1).
Gandhi enfatizava
a importância da autolimitação das necessidades e foi para Sachs uma referência
no tema do desenvolvimento: “Gandhi para mim era e continua a ser o precursor
das boas teorias de desenvolvimento, pela maneira como considerava a massa
camponesa como o ator central do processo de desenvolvimento.” Sachs também foi inspirado pelo prêmio Nobel de Economia
Amartya Sen: “Foi a leitura de Amartya Sen que me levou a propor a
reconceitualização do desenvolvimento em termos de universalização efetiva do conjunto
das chamadas três gerações de direitos: os direitos políticos, civis e cívicos
(a democracia como pedra angular, foundational value, diz Sen); os direitos
econômicos, sociais e culturais, incluindo o direito ao trabalho decente; e por
último os direitos coletivos do desenvolvimento, ao meio ambiente, à infância”.(2)
Nos anos
50, enquanto fazia o doutorado em Delhi,
Ignacy Sachs vivenciou o forte prestígio internacional daquele país, que
demonstrava grande confiança em si próprio e que recebia chefes de estado e
cientistas sociais de fama mundial. Também são presentes em textos de Sachs a admiração pela Índia, descrita como terra de
inspiração e laboratório do desenvolvimento. Neles, expressou sua dívida
intelectual para com os indianos e nomeou aqueles de quem recebeu estímulos: os
economistas K.N. Raj, ex-reitor da universidade de Delhi; Sukihomoy
Chakravarti; Deepak Nayar, reitor da universidade de Delhi; Amartya Sen. Além
deles, Sachs relembra a importância dos
contatos com outros cientistas, tais como o politólogo Rajni Kothari; o
historiador da ciência Rahman; Ashok Parthasarathi; Amulya K.N.Reddy; M.S.
Swaminathan; Anil Agarwal; o ecologista Gadgil e o historiador Guha.
Ao
acreditar na importância da cooperação entre países tropicais, que podem
construir civilizações modernas da biomassa, Sachs enfatizou a necessidade de
abre-alas para esse desenvolvimento e propôs que o Brasil e a Índia assumam tal
posição. Reforçou a importância dos brasileiros se aproximarem dos indianos
através de rede de cooperação técnica por biomas. Ao postular a reforma da ONU,
Ignacy Sachs enxergou as possibilidades da liderança colaborativa desses dois
países no aprimoramento das instituições internacionais, oxigenando o ambiente
e fazendo circular ideias novas, originárias do pensamento do sul.
Hoje
continuam precários os laços culturais e de comunicação entre esses países. Para
transpor esse abismo propôs estabelecer um centro de pesquisa sobre o Brasil
contemporâneo em uma universidade indiana e um centro de pesquisa sobre a Índia
contemporânea em uma universidade brasileira e intercambiar estudiosos e
bolsistas, criando massa crítica de pessoas que lancem pontes de cooperação.
Seria uma estratégia para, em poucos anos, formar um conjunto de jovens com
melhor conhecimento mútuo.
A Índia é
uma terra fértil para se estudar e compreender a evolução humana e o papel que a nossa espécie desempenha
nessa atual crise da evolução. O conhecimento aprofundado sobre psicologia e
sobre a natureza do ser humano encontrado em filosofias indianas ajuda a lidar
com esse grande ator da crise atual. No campo da ecologia do ser, dos estudos
da consciência e da educação integral, a civilização indiana é guardiã de
riquezas valiosas para a autosuperação humana.
A cosmovisão indiana propõe que cada um de nós
nessa vida tem seu dharma, sua missão ou tarefa a cumprir. Trabalhar
pela aproximação Índia-Brasil tornou-se parte de meu dharma, que exerço
com alegria. Agradeço à Índia pela inspiração que me proporcionou.” (Maurício
Andrés Ribeiro é ex-pesquisador visitante no Indian Institute of Management,
Bangalore. Autor de Tesouros da Índia para a civilização sustentável. www.ecologizar.com.br
ecologizar@gmail.com)
*Sachs foi professor da Universidade de Varsóvia
e conselheiro especial da Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e
Desenvolvimento, Eco-92. É autor de vários livros e artigos: Capitalismo de
Estado e subdesenvolvimento (Vozes, 1969), Ecodesenvolvimento: crescer sem
destruir (Vértice, 1981), Espaços, tempos e estratégia de desenvolvimento
(Vértice, 1986), Estratégias de transição para o século XXI; A terceira Margem.
[1] Estudos
avançados vol.18 no. 52 São Paulo Dec. 2004. Experiências internacionais de um
cientista inquieto. Entrevista com Ignacy Sachs
[2] In A Terceira Margem, pág. 316.
*Fotos de arquivo
VISITE TAMBÉM MEU OUTRO BLOG "MEMÓRIAS E VIAGENS", CUJO LINK ESTÁ NESTA PÁGINA
terça-feira, 5 de agosto de 2014
CONSIDERAÇÕES SOBRE O BELO
Escreve Edgar Poe: "Nós somos devorados por uma sede
inextinguível. Esta sede faz parte da imortalidade do homem. Ela é uma conseqüência
e, ao mesmo tempo, um sinal de sua existência sem termo"... "Então,
quando a poesia, ou a mais enervante das formas poéticas, a música, nos fazem
cair em lágrimas, choramos, não por excesso de prazer, e sim em razão de uma
melancolia positiva, impetuosa, impaciente, que experimentamos por causa da
nossa incapacidade de discernir,
plenamente, aqui nesta terra, uma vez por todas, aquelas alegrias divinas de
que, através do poema ou da música, não atingimos, senão vislumbramos." ¹
O homem tende naturalmente para o que é eterno. Ele se
inquieta, procurando uma razão de ser para sua vida, aspirando ao que há de bom
e verdadeiro no mundo. É o ideal de perfeição, a sede insaciável de eternidade.
O artista, procurando elevar-se acima de si mesmo através da
arte, aspira à Beleza absoluta, e, mesmo inconscientemente, procura Deus. A
beleza artística é um reflexo da Beleza Incriada, assim como toda luz é uma
certa irradiação da primeira Claridade Divina.
A tendência natural da arte é de se elevar, aperfeiçoando-se
cada vez mais.
Abrindo um parenteses, consideremos aqui um ponto menos
esclarecido: é preciso distinguir a beleza da natureza da beleza artística. O
belo em arte não é o belo da natureza. É frequente confundir-se a beleza
natural com a beleza espiritual, realizada na obra de arte. "Uma vez que
na vida a beleza física é geralmente regular e a tradição clássica faz da
regularidade uma das condições de beleza, constitui ainda opinião corrente que
o belo é, também, na arte, sinônimo de regular.” (Matteo Marangoni).
A beleza da arte é puramente espiritual,
expressiva. É a emoção dirigida pela inteligência em busca de uma forma ideal
que, muitas vezes, pode parecer feia e pueril aos olhos do leigo.
Assim, ouvimos julgamentos como estes, principalmente em se
tratando de Arte Moderna: "Isto até uma criança poderia fazer." -
"Isto não passa de um rabisco."
No entanto, o quanto de sofrimento e luta para se chegar
àquela simplicidade, àquele despojamento completo do supérfluo, àquela síntese
de vida.
Os escolásticos, seguindo a doutrina de São Tomás, dão como
condições de beleza a integridade, a proporção, brilho ou clareza. Mas
ressaltam, também, que não existe uma só maneira, mas mil e dez mil maneiras de
a noção de integridade e proporção poderem realizar-se. Tanto as figuras Gregas
e Egípcias, como as de Rouault e Picasso são perfeitamente proporcionais, nos
seus gêneros.
Como dizia Jacques Maritain, “as noções de integridade e
proporção não têm nenhuma significação absoluta; visam, antes, ao fim da obra,
que é de ' fazer resplandecer uma forma sobre a matéria”, isto é, de expressar
uma ideia coerente, harmoniosa.
"Todas as coisas que povoam a terra encontram-se em
constante mudança e, por conseguinte, em constante movimento; mas uma lei
igualmente universal governa seu movimento: um impulso para encontrar uma
condição de harmonia e repouso: harmonia, maturidade e cristalização. A forma
pela qual a matéria encontra um equilíbrio de forças constitui sua perfeição,
uma solução para o seu problema particular no qual não existe desperdício nem
superfluidade. Se acrescentarmos ou retirarmos algo a esta perfeição, a forma
perde seu equilíbrio, seu aspecto característico, e deve-se recomeçar a busca
de ambos." (Karel
Honsih)
Tudo o que existe, em sua constante renovação procura
atingir a Beleza Absoluta ou ser um reflexo dela.
A procura de perfeição através da arte assemelha-se a este
incessante movimento da natureza que busca o equilíbrio nas células
microscópicas, no desabrochar de uma flor, nos grandes espaços interplanetários
do universo.
"O Belo consiste na ordem e na grandeza", dizia
Aristóteles em sua Poética. Ordem e grandeza, no entanto, não poderão ser
padronizadas dentro de cânones rígidos, diversificando-se conforme a exigência
de cada obra de arte em particular.
A fusão dos diversos elementos que constituem a matéria
pictórica, a cor e a linha, os planos e as sombras, as texturas, os relevos
devem na sua multiplicidade de sugestões procurar a unidade de um conjunto
harmonioso.
Para haver beleza num quadro ou numa escultura, é preciso
que haja a adequação perfeita do espírito com a matéria, da ideia criadora com
a forma realizada.
(Trecho do meu livro “Vivência e Arte”, editora Agir, 1966)
*Fotos de Maria Helena
Andrés
VISITE TAMBÉM MEU OUTRO
BLOG “MEMÓRIAS E VIAGENS”, CUJO LINK ESTÁ NESTA PÁGINA.
Assinar:
Postagens (Atom)