O Cine Brasil me lembra a infância, quando foi
inaugurado na década de 30. Vestíamos roupas domingueiras, chapéu na cabeça,
para assistir às matinês de domingo, com os filmes desfilando aos nossos olhos:
Marlene Dietrich, Greta Garbo, Robert Taylor, Tyrone Power e Shirley Temple com
seus sapateados. Entrei até para uma aula de sapateado com Natália Lessa,
professora de dança das meninas do society belorizontino.
Agora restaurado pela Vallourec, o Cine Brasil está
proporcionando ao público da cidade uma exposição monumental da obra de Cândido
Portinari, um documentário maravilhoso de um dos maiores pintores brasileiros.
O catálogo Rasoné desfila o seu itinerário em
projeções de desenhos, estudos, a caminhada longa e muitas vezes dolorosa do artista
de Brodowski. Consegui permanecer sentada por muito tempo porque a obra do
mestre é realmente grande e empolga os espectadores mais interessados em sua
curta caminhada por este planeta. É um exemplo de tenacidade e persistência na
arte, a seriedade em preparar cada painel com estudos, croquis, até chegar ao
resultado final já com cores.
Portinari morreu pela arte, intoxicado por tinta.
Foram apenas 53 anos de vida, deixando uma obra que se prolonga no tempo com a
força e a energia de um grande artista.
Conheci-o pessoalmente, como aluna de Guignard,
fiquei horas diante do painel da Igrejinha da Pampulha, vendo Portinari,
ajudado por uma equipe de bons artistas vindos do Rio, preparando as tintas,
misturando cores para a realização de um mural que é hoje um símbolo para todos
nós de Belo Horizonte.
Naquela ocasião João Cândido era criança, mas o
acompanhava sempre em suas viagens, em seu trabalho. Hoje João Cândido é também
artista, coordenando e promovendo a obra de seu pai. Elaborou o Projeto
Portinari e organizou o Catálogo Rasoné, com toda a trajetória do mestre.
Agora, no Cine Teatro Brasil, o público acompanha os
passos dos dois painéis pertencentes à ONU, com o desdobramento dramático da
Guerra e da Paz.
Assisti Portinari pintar Guerra e Paz no Rio de Janeiro,
hoje aqui estou, admirando o itinerário histórico do artista.
Guerra e Paz continua a ser o tema do momento, sua
mensagem é perene e não tem fronteiras. Guerra e Paz nos emociona porque está
presente, dentro de cada um de nós em cada momento, enquanto percorremos nossa
trajetória de vida no planeta.
No 5° andar do Cine Brasil, pode-se apreciar uma
releitura da obra de Portinari realizada em bordados pelo grupo Matizes Dumont
de Pirapora. O drama e a poética do mestre continua inspirando artistas tais
como Sérgio Campos, formado pela UFMG, que há dez anos se dedica ao estudo da
obra de Portinari.
Selecionei alguns trechos do catálogo, sobre os
painéis “Guerra” e “Paz”:
“Portinari não identifica guerra alguma, como se
afirmasse que em sua essência todas se equivalem no desencadeamento de horror e
animalidade... Figuras em grupo compacto, genuflexo, braços levantados com as
mãos espalmadas e rostos voltados para o céu, nesse cenário de morte deixam
transparecer uma aragem de força e vida, de condenação à própria existência da
guerra”
“O que emana do painel “Paz” nos enleva e encanta,
mais que a idéia de paz, é a própria paz que nos invade ao contemplá-lo. É a
sensação de penetrarmos num universo de paz, de comunhão fraterna no trabalho
produtivo, num reino mágico de cores reluzentes, do som da ciranda de jovens
num canto universal de fraternidade e confiança, ou da candura dos folguedos
infantis. Com todos esses tons dourados, alegres, crepitantes de vida, o pintor
parece nos dizer: a paz é possível. Dia virá em que a humanidade desfrutará da
paz sem limites no espaço e no tempo.”
*Fotos de arquivo
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