Artista plástica, ex-aluna de Guignard. Maria Helena Andrés tem um currículo extenso como artista, escritora e educadora, com mais de 60 anos de produção e 7 livros publicados. Neste blog, colocará seus relatos de viagens, suas reflexões e vivências cotidianas.
terça-feira, 29 de outubro de 2013
ESCHER, UM DESPERTAR DO “VER”
A exposição do artista holandês Escher no
Palácio das Artes, de uma beleza extraordinária, foi para mim um toque de
consciência e um despertar da percepção visual. Lembrei-me das aulas do mestre
Guignard, quando ele fazia um quadrado pequenino, dentro de uma cartolina
branca. O aluno teria de ver o mundo através daquele orifício e o mundo se
desdobrava em mil facetas diversas, apontando direções inusitadas. As coisas
eram vistas dentro de um todo imensurável, como um caleidoscópio. Este
exercício possibilitava ao jovem a compreensão da multiplicidade da vida visto
através do “aqui e agora”. Este “aqui e agora”, tão proclamado pelos orientais
que buscam o contato com a Essência, é realizado através dos tempos quando a
arte é vista como um processo, uma busca, um encontro. Escher nos abre a percepção
e nos coloca com uma visão espacial pouco vislumbrada pelo ser humano distraído,
envolvido em seus próprios pensamentos.
A volta ao passado muitas vezes é um
impedimento para o presente. Viver o presente, o “aqui e agora”, o poço onde
nos vemos em profundidade, a ilusão dos espelhos que multiplicam nossa imagem,
tudo isto é motivo de reflexão.
Ninguém consegue sair da exposição “A
magia de Escher” sem ser atingido pela magia de suas propostas.
Saio de lá refletindo no poder da
criatividade que nos permite ver a unidade na multiplicidade sem palavras,
apenas com objetos, desenhos, esculturas, instalações. Na rua, já do lado de
fora do Palácio das Artes, vou reparando que o “Escher” continua nos prédios em
torno, nas avenidas, nas janelas que se fecham escondendo mistérios, nas
escadas onde as pessoas estão sempre subindo ou descendo. O mundo é um grande
teatro, uma grande performance, sem necessidade de mostrar que é uma performance,
simplesmente o mundo a cada instante nos mostra o novo, o não visto, o não
interpretado.
Escher é um mestre disfarçado em artista,
um verdadeiro mestre, porque faz o espectador, não somente participar, mas
recriar seu próprio mundo de sonhos.
Selecionei algumas frases do seu catálogo:
“Trabalhando com conceitos clássicos da
arte pictórica, como a perspectiva, o moto-perpétuo e o reflexo,
entretecendo-os com sistemas de ladrilhamento do plano e outros conceitos
matemáticos, Escher criou universos inteiros.”
“O mundo de Escher combina objetos incompatíveis.
O artista sempre nos propõe a mesma questão: “Por que o mundo - ao menos o
mundo retratado na arte – não pode ser uma combinação de diferentes
realidades?”
“Talvez eu esteja sempre em busca do espantoso
e, por isso, procure apenas provocar espanto no espectador”(Escher)
“Não conheço prazer maior do que errar por
vales e montes, de aldeia em aldeia, deixando a natureza sem artifícios agir
sobre mim, apreciando o inesperado e o extraordinário, no maior contraste
imaginável com o dia a dia caseiro”(Escher)
*Fotos de arquivo
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domingo, 6 de outubro de 2013
ANTONIO BENTO, CRÍTICO INCENTIVADOR DAS ARTES
Por
ocasião da minha primeira exposição de arte abstrata no Rio de Janeiro, em
1953, na Galeria do Instituto Cultural Brasil - Estados Unidos, o conhecido
crítico de arte Antônio Bento, do Diário Carioca, escreveu o texto abaixo,
motivo de grande incentivo para o meu trabalho. Guardei suas palavras com muita
atenção, o que me motivou anos mais tarde a desenvolver esculturas baseadas nos
desenhos daquela época.
“O mérito maior que revelam
os quadros de Maria Helena Andrés, principalmente os da última fase, reside no
fato da pintora ter marchado por si mesma para a arte não representativa, na
cidade de Belo Horizonte, onde, além de raras incompletas exposições, não há
museus, gabinetes de estampas ou coleções privadas em que se encontrem quadros
dessa tendência. Marchou para a abstração levada mais pelo espírito de aventura
e de pesquisa de um meio novo de expressão - do que propriamente por uma
imposição do ambiente ou por simples conformismo.
Tendo começado a fazer abstrações ou
formas baseadas na realidade, como se vê de sua tela representando um rebanho
no pasto, em breve Maria Helena Andrés
se encontrava diante dos problemas específicos da pintura não-objetiva.
Seus últimos quadros já denotam um
progresso sensível, mostrando que a artista começa a manejar a linguagem
abstrata, livremente, por si mesma, sem recorrer à gramática dos abstratos
suíços ou dos concretos, em seus exercícios intermináveis de círculos,
quadrados, triângulos, “confettis” multicores, feixes de linhas, tudo isso
arranjado, com maior ou menor habilidade dentro do espaço pictórico.
A artista procura agora estruturar suas
composições dentro de ritmos ou de combinações de forças e cores menos
estereotipadas que as concretas já conhecidas. E sabe desenhar com segurança,
como se pode verificar pela série da “Via Sacra”. Alguns desses desenhos
possuem uma grande pureza linear. E são, ao mesmo tempo, de uma qualidade
arquitetônica irrecusável. Lembram esculturas de fio de ferro, pela nitidez com
que se erguem no espaço, parecendo feitas para uma vida mais transcendente que
a do simples desenho em preto e branco. As últimas composições da artista
denotam uma segurança que não se encontra em muitos dos nossos abstratos de
maior experiência. E revelam também uma sensibilidade apurada. Sente-se que a
pintora tem alguma coisa a dizer na plástica abstrata, trazendo a sua
contribuição a uma arte que requer autenticidade, pois do contrário não passará
de um simples exercício acadêmico”. (Antônio Bento, Diário Carioca, Rio de
Janeiro, setembro de 1953)
*Fotos
de arquivo
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