Um dia, um senhor apareceu lá na minha casa em Belo Horizonte, afim de me convidar para realizar um painel. Seria para o Hotel Del Rey em Belo Horizonte. Teria que citar a cidade de Diamantina, onde viveu a Chica da Silva e onde meu pai tinha estudado por um tempo.
Comecei a desenhar os primeiros croquis do painel, mas sempre acompanhando um pouco a história. Ele me forneceu informação sobre a história da Chica da Silva e eu comecei a imaginar aquela escrava, dominando a cidade de Diamantina, vindo de longe pessoas para conhecê-la. Ela era muito importante, era uma escrava inteligente.
Para ter mais informações, recorri ao Romanceiro da Inconfidência de Cecília Meireles, retirando alguns trechos sobre a Chica da Silva. Alguns textos estão escritos no painel.
"Que andor se atavia naquela
varanda?
É a Chica da Silva
É a Chica que manda "
Comecei a imaginar a vida da Chica da Silva da minha forma, pensando que ela era como uma pessoa muito bonita e muito poderosa também para mandar na cidade. Casada com um homem muito importante. Pensar na cidade de Diamantina, de onde os portugueses levaram muitos brilhantes.
Recentemente eu estive lá e pude ver a
varanda onde Chica da Silva ficava. Muito interessante lembrar disso tudo.
Maria Helena e sua irmã Maria Regina diante da casa de Chica da Silva- 2023 Foto Maurício Andrés. |
Voltemos à época em que eu recebi o
convite.
Mandei fazer três telas, uma central de
tamanho maior, mas todas muito altas. Era difícil colocar as telas no meu ateliê,
tive que colocá-las no chão. Naquela época eu era muito mais jovem, deitava no
chão para pintar, suspendia a tela, e a movimentava para pintar de todos os
lados. Eu tinha que fazer um esforço físico para acompanhar o esforço mental.
Foram feitos os três painéis e depois de prontos foram colocados no Hotel Del
Rey, na praça Afonso Arinos.
Para o pagamento de parte do painel, o dono do
Hotel propôs uma permuta.
"Mas permuta, como? Se eu moro em
Belo Horizonte, por que vou querer uma permuta de hotel na minha própria
cidade?"
"Não tem importância", me
respondeu ele. "Nós temos um ótimo restaurante no hotel. Você pode
convidar pessoas para almoçar ou jantar, que nós teremos o maior prazer de
pagar parte desse painel com jantares."
Eu achei muito interessante. Eu tenho
uma família grande, os filhos eram jovens e muito interessados em pratos
apetitosos. Íamos ao Hotel Del Rey para comer uma fatia do painel. Foi
maravilhoso pensar isso. Eu já fiz muitas permutas, gosto muito disso e trocava
com prazer a permuta de um hotel por alguma coisa que fosse interessante. Neste
caso foram os jantares. Levava a família inteira e eles adoravam.
Dessa forma foi feito o painel.
Deixo
agora a palavra para o Maurício discorrer sobre os lugares onde esteve o painel
da Chica da Silva:
“Esse painel foi encomendado para o Hotel Del Rey e posteriormente esteve no Hotel Dayrell em Belo Horizonte. Em sua antologia biográfica, o livro Guerreira de Bronze, A.L.P. Gouthier, descendente de Chica da Silva, e proprietária do painel, descreve essa trajetória. O painel de Francisca - a escrava que queria ver o mar e para quem foi construído um barco e um lago em Diamantina - foi levado para um apartamento em Ipanema de frente para o mar. O painel atualmente se encontra em Lisboa, Portugal, para onde foi chamado e onde faleceu o contratador de diamantes João Fernandes, que a amava. O belo painel de Maria Helena Andrés sobre Chica da Silva simboliza esse reencontro."
Chica da Silva
Isso foi lá para os
Lados do Tijuco,
Onde os diamantes
Transbordavam do Cascalho
Que ardor se atavia
Naquela varanda.
É a Chica da Silva,
É a Chica que manda.
Cara cor da noite,
Olhos cor de estrela,
Para conhecê-la.
Escravas, mordomos
Seguem como um rio,
A dona do dono
Do Serro do Frio.
E em tanque de assombro
Veleja o navio,
Da dona do dono
Da Serra do Frio.
Aonde o leva, a brisa
Sobre a vela panda?
A Chica da Silva,
A Chica que manda.
Poema © Cecília Meireles.
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