“As luas, os mastros,
os mistérios,
As velas que pretendem
voar!
E, no entanto,
prendê-las à terra.
Amarrá-las ao concreto
e limitado da lã.
O desenho não nasceu
somente para ser tapete.
Houve que
surpreendê-lo, mostrando-lhe possibilidades ocultas.
E nisto, a busca
apaixonada da verdade de cada forma, de cada cor, de cada desejo.
Percorremos, meses a
fio, a larga estrada
Que nos levou da
ambição do que nos propusemos,
Ao que, realmente
conseguimos.
Dar ao desenho de Maria
Helena Andrés,
Outra fase,
Numa outra matéria.”
(Maria Ângela Almeida Magalhães)
Maria Ângela foi minha
parceira nas tapeçarias durante vários anos nas décadas de 60 e 70.
Transcrevo abaixo um
texto que escrevi em 1969, sobre tapeçarias e murais:
“Quando em agosto deste
ano realizei na Galeria do Copacabana Palace uma exposição de pinturas da fase
interplanetária, outra série de meus trabalhos já se elaborava no Rio, numa rua
de Botafogo, entregue a uma equipe de artesãs. Ao mesmo tempo em que eu pintava
e expunha a série de astronautas, outras mãos trabalhavam em meus tapetes.
Os 12 tapetes serão
expostos em Belo Horizonte em 6 de outubro, na Galeria Guignard. Há dois anos
projetei uma série de pequenos estudos sobre os barqueiros do São Francisco,
tendo como finalidade a execução de um mural. No entanto, não tendo podido
realizar o trabalho, guardei os estudos em meus arquivos, para algum tempo mais
tarde entregá-los ao Artesanato da Providência, dirigido por Maria Ângela
Magalhães e Gilda Carneiro. Seria a oportunidade de ver realizado o que eu
planejara para o mural, mas que não pudera executar.
Encontrei nesse artesanato
a possibilidade de dar sequência ao meu estilo de arte, contribuindo até para
maior enriquecimento com os recursos próprios da tapeçaria. Nuances e
transparências não precisavam ser suprimidas e poderiam ser sugeridas com lãs
de vários matizes e a mistura de materiais novos. Acompanhei o trabalho vindo
ao Rio todos os meses, mas deixando à orientadora de meus estudos, Maria
Ângela, a iniciativa de criar pontos e inventar recursos novos dentro do
metier. A pintura individualista, criada e executada por uma só pessoa, vem
sendo substituída nestes últimos tempos pelas equipes de arte com um
responsável e vários colaboradores. É necessário, no entanto, que essas equipes
sejam bem entrosadas, que haja a adequação perfeita das mãos que executam com
aquelas que criam o projeto. Dentro deste esquema a criatividade é distribuída
e reforçada para que se possa fazer alguma coisa de maior vulto, com a responsabilidade
dividida entre vários.
Meus cartões são
desenhados em pastel sobre papel veludo, permitindo desde o início imaginar o
efeito a ser conseguido no aveludado das lãs.
Orientadas por Maria
Ângela, as artesãs transformam o projeto em tapeçaria.
A tapeçaria e a pintura
mural têm raízes comuns. Ambas exigem certa monumentalidade, a captação de um
conjunto global, concentrado em determinado espaço. Portanto, quanto maior e
mais muralística, mais apta estará a tapeçaria para preencher a finalidade à
qual se destina, que não é simplesmente decorativa, mas visa a integração a
determinado conjunto arquitetônico. Daí a razão para considerar os projetos de
mural mais adequados para tapeçaria do que os estudos para um quadro. O mural
exige um pouco de reflexão, o exame detalhado de cada espaço, de cada forma. A
espontaneidade tem de ser corrigida e orientada pela inteligência. A monumentalidade
exigida pelo mural não é a simples ampliação de figuras ou cenas, mas a visão
global de determinada ideia, a síntese de um conjunto. A
tapeçaria pode ambicionar também a conquista desta monumentalidade. Isto porque
tapeçaria não é somente arte decorativa, mas deve expandir-se a campos mais
amplos.
Pretendo conduzir meus
tapetes ao mesmo destino do mural. Acho que é um caminho sério, os recursos são
grandes, possibilitando maior enriquecimento daquilo que imaginei um dia num
simples cartão colorido.
*Fotos de Maurício
Andrés e de arquivo
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