A personalidade de Guignard como mestre delineia-se com maior nitidez mediante o confronto de seu método revolucionário de ensino, baseado no apoio à iniciativa pessoal, com o ensino nas escolas de arte de orientação acadêmica. As escolas acadêmicas prevaleciam nos grandes centros brasileiros quando Guignard chegou a Minas. Aos conhecimentos adquiridos na Europa, ele aliava seu grande poder intuitivo para desvendar o caminho ainda obscuro do ensino moderno, no qual técnica e capacidade criadora se desenvolvem de maneira conjugada, o lápis não reproduz a fria documentação de um objeto, mas transmite toda a força emocional de um momento de criação.
Nessa orientação artística, o aluno não visa apenas o recebimento de um simples diploma ao final de um currículo, mas a vivência de uma formação estética que não termina no período de aprendizagem, mas prolonga-se por toda a vida. De acordo com essa visão, a arte constitui uma riqueza insubstituível, porque se apóia numa estrutura viva e espiritual e não apenas no interesse imediato. Procura a integração do homem ao universo, através do desenvolvimento de suas aptidões individuais.
Mais do que ninguém, Guignard conseguia vislumbrar a coisa nova, a individualidade que se revela na variedade de temperamentos humanos, agora estudados com grande interesse à luz da psicologia moderna. Observações feitas à margem de um catálogo, referindo-se às tendências de cada aluno em particular, revelam esse senso profundo para descobrir vocações e conhecer temperamentos. Uma concepção ampla da realidade humana o levava a valorizar tanto o aluno que desenhava realisticamente um retrato a lápis duro, quanto aquele que se afastava por completo do modelo, para imprimir na tela imagens subjetivas. Ao se dirigir ao aluno, seus olhos enxergavam através da insegurança, conseguiam vislumbrar o traço feliz, a mancha de cor e todas as possibilidades que se escondem atrás de um tímido desenho.
Guignard era simples e possuía humildade daqueles que são realmente grandes. Não via no aluno um futuro concorrente, mas um companheiro de arte que despertava diante de seus olhos. Muitas vezes, ao criticar um trabalho, seu entusiasmo chegava a ser comovente: "Você desenha melhor do que eu”, escutei-o dizer a um colega, "mas deixa estar que ainda chegarei lá". Ao corrigir o trabalho de um aluno ele muitas vezes se entusiasmava e o assinava.
Em 1947, Guignard me presenteou com um quadro, representando um caminho no Parque Municipal de Belo Horizonte. Esse quadro sugeriu o título para o meu livro Os caminhos da arte. Mais tarde, depois de sua morte, descobri debaixo de um de meus desenhos uma pequena aquarela de Guignard representando os céus de Minas. Foi exatamente na época em que iniciei a minha fase de naves espaciais.
Trabalhando junto com seus alunos, Guignard reviveu de maneira quase única o antigo mestre, figura desaparecida nos tempos modernos. Atualmente, o ensino se distribui em diversas cátedras, com horários marcados e contato reduzido do professor com os alunos. Anteriormente às academias de Belas Artes, o mestre - fosse ele filósofo ou artesão - trabalhava lado a lado com seus aprendizes e a eles se misturava, sem preocupação de superioridade, desejando apenas transmitir experiências. Assim foi Guignard, o mestre moderno, que ensinava uma arte de vanguarda, não ditava leis, mas fazia o aluno descobrir o equilíbrio e a proporção no próprio trabalho, sem demonstrações dogmáticas.
Mestre autêntico, não julgava segundo suas inclinações e preferências, mas desinteressadamente, compreendia o aluno e o conduzia. Ele não trazia valores fixos a decretar - despertava valores novos no contato de sua presença, de seu estímulo.
Fotos de arquivo e da internet
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