terça-feira, 30 de agosto de 2011


HELOISA OLIVEIRA, UMA BRASILEIRA NO BUTÃO


Conheci Heloisa Oliveira na década de 80, quando ela acabava de chegar de uma viagem às ilhas de Bali, na Indonésia. Heloisa,  fotógrafa e dançarina, seguia o seu chamado interno de viajar pelo mundo. Quando a conheci ela já havia morado no Japão, Inglaterra e Estados Unidos.

Em suas viagens pelos países orientais, a jovem artista registrava em fotos os aspectos de uma cultura ainda desconhecida para nós ocidentais.

“A dança em Bali não é para ser apresentada nos palcos, ela faz parte da vida do povo e revela estados mais profundos de consciência.”

As palavras de Heloisa me tocaram. Estávamos juntas no caminho que busca a abertura de consciência através da arte e os países orientais, ainda não poluídos pelas referências materialistas do mundo ocidental, ali estavam para oferecer aos pesquisadores e viajantes da grande universidade da vida, uma referência pura do sentido da dança como meditação.

Acompanhei Heloisa a um bairro da periferia de Belo Horizonte onde um grupo se reunia aos domingos para dançar a “dança de roda” da tradição africana. Crianças, jovens e velhos se harmonizavam ao som de instrumentos musicais e ao ritmo dos tambores.

Heloisa sempre foi uma personalidade ativista na defesa da natureza. À frente de movimentos no Retiro das Pedras, ela organizava caminhadas e cerimônias seguindo a  linha das tradições indígenas.

Heloisa foi convidada para a coroação do rei do Butão que aconteceu em novembro de 2008. O Butão está situado no alto dos Himalaias, próximo à Índia e ao Nepal. É um lugar de rara beleza onde a civilização ocidental ainda não exerceu a sua influência. Ali  somente pessoas escolhidas por eles podem visitar os templos e assistir às cerimônias. As danças sagradas foram registradas com grande sensibilidade pelas lentes de Heloisa, a fotógrafa.

De acordo com o depoimento de Heloisa, “grupos de monjes budistas, de várias regiões do Butão se reúnem no palácio de verão do primeiro Rei , em Yungdrung Choeling, no Vale de Trongsa.  Executam danças rituais (Cham) reveladas em visões pelo santo e
Terton-revelador de tesouros sagrados, Pema Lingpa, do século XV.
Dançam em reverência ao relicário que contém seus restos mortais embalsamados, ¨stupa¨. Estas linhagens de Cham, ou danças sagradas de máscaras, sobrevivem hoje como uma das tradições intactas de movimento ritual, fortemente preservadas no Butão.
O ano de 2007, anunciava grandes mudanças para o país, um momento histórico para o Butão: com a abdicação ao trono, o Quarto Rei conduziu o país à Democracia Parlamentarista.”

*Fotos de Heloisa Oliveira

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domingo, 14 de agosto de 2011

DIALOGANDO COM FRANCISCO JARAUTA

Grandes mudanças do século XX aconteceram nas décadas de 1960 e 1970 quando o mundo das comunicações despontou, propiciando a formação da sociedade informatizada. Para discutir essas mudanças o Festival de Inverno da UFMG, que aconteceu em 2011 em Diamantina, Cataguazes, Belo Horizonte e Inhotim, convidou palestrantes atualizados com o espírito da época, que enriqueceram e despertaram os jovens para a grande síntese que está acontecendo no planeta.

A proposta do Festival de Inverno de 2011 foi “discutir a nova configuração da arte, da cultura e do conhecimento a partir da perspectiva das cidades”. Francisco Jarauta, famoso filósofo, antropólogo e historiador espanhol, foi convidado pela UFMG para pronunciar palestras sobre o tema. A grande competência do filósofo, sua facilidade de expressão, abriram campo para reflexões nos diversos grupos de estudantes e professores que tiveram a oportunidade de ouvi-lo. A sua passagem por Minas Gerais foi coroada de sucesso, levando às suas conferências um publico jovem, interessado no pensamento da cultura contemporânea. Jarauta fala espontaneamente e sempre acrescenta ao seu pensamento as experiências do momento, do aqui e agora. Este instante presente incorporado ao passado constitui a grande riqueza do século XXI onde a integração e a síntese se fazem presentes.  A palavra de Jarauta é fluente, cheia de força e convicção, sem ser dogmática. Com grande espontaneidade criativa ele consegue atrair as pessoas que acompanham com atenção o seu pensamento.

Jarauta abordou em suas palestras a relação da arte com as novas tecnologias, as cidades e as microutopias. Um mundo sem fronteiras se abre diante de todos nós. Já não existe no momento a separatividade imposta pelos donos da verdade. A verdade está dentro de cada um de nós e é despertada no momento certo, no agora de cada um. É aí, nesse momento, que o novo se manifesta com toda a intensidade.  Na fala de Jarauta, o novo vai surgindo a cada instante e trazendo luz para novas associações. Ele convida o público a participar de sua palestra, abrindo o espaço para o diálogo.

Recentemente Jarauta foi o curador de uma exposição de Matisse, que aconteceu em Granada, e me presenteou com um livro Matisse y La Alhambra onde, além de escrever o prefácio, colabora com um capítulo onde  estuda a influência do Oriente sobre Matisse, dentro de uma visão filosófica e antropológica. Em Alhambra, na Espanha,  Matisse encontrou ressonância com a sua sensibilidade e uma série de quadros nos mostra o seu entusiasmo pelos arabescos, florões e odaliscas. A influência árabe desponta em suas telas, no colorido exuberante, na sensualidade e poesia das formas. Alhambra é um pedaço do Oriente no coração do Ocidente e continua influenciando artistas e historiadores da arte.

Durante sua passagem por Belo Horizonte, tive o privilégio de receber Jarauta em minha casa e também a alegria de mostrar-lhe os meus pequenos desenhos, feitos na década de 50, que hoje estão sendo ampliados para diversas releituras. Integração e síntese são o que pretendo realizar no momento, e as palavras de Jarauta me deram ânimo para continuar minha pesquisa atual.

Assim se expressou Jarauta em sua mensagem pela internet: “Seus trabalhos mostram com grande sensibilidade e inteligência um caminho e experiência própria sobre a arte e sua própria linguagem. Que prazer tão imenso ter compartilhado a tarde em sua casa, um ateliê pleno de vida e magia. É tão admirável ver seu trabalho, suas viagens, suas idéias e princípios, sua concepção da arte.”

*Fotos da internet, de Marília Andrés e Tatiane Lutkenhaus

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sábado, 13 de agosto de 2011

segunda-feira, 1 de agosto de 2011

HERMETO PASCOAL E A IMPROVISAÇÃO NA MÚSICA

Estou sentada num banco de rua, tomando o sol da manhã. No Rio está chovendo, aqui o sol brilha e os pássaros cantam, num concerto grátis, improvisado. Celebram a beleza do dia. Transeuntes passam apressados, sem verem nem ouvirem o canto da manhã de sol. Um senhor de idade vem sentar-se no banco da frente, trazendo uma cachorrinha preta de olhos azuis. Todos os dias ele faz este mesmo itinerário. A cadela está atenta para não perder o dono de vista. Debaixo da palmeira, sob uma pedra, um alto-falante toca música eletrônica o dia todo. Estou lendo o jornal de cultura que noticia a presença em Belo Horizonte de Hermeto Pascoal, considerado o músico bruxo, que tira sons de todas as coisas. Na Índia, já escutei também grupos musicais tirando sons da natureza e do corpo. Participei de concertos improvisados com duração às vezes de 4 horas, os músicos sentados no chão, cantando e improvisando ao sabor do momento. O momento presente é muito importante para se perceber a criatividade em sua fonte natural que é a vida. O “Agora” vivenciado através da música nos proporciona momentos de paz e harmonia com todos os seres vivos. Lá longe, na Índia, os músicos continuam improvisando.Relacionaram seus sons com o canto dos pássaros, o zumbido dos insetos, o correr das águas.Volto ao Brasil, ao banco de rua. Leio o depoimento no jornal, de Hermeto Pascoal, referindo-se à sua música e à interatividade com o público.“No show acontecem coisas imprevisíveis. Isso porque, nas mãos do poder de improvisação, prazerosamente acatado pelo público, muitas outras canções surgem. No último show exagerei, cantei quatro vezes com o público, Ave Maria! O povo nunca cantou tanto comigo. É uma confraternização que acontece quase espiritualmente”, explica ele. A música de Hermeto é universal e se utiliza da mistura de sons de todo o mundo, podendo ser compreendida em qualquer lugar do planeta. Ele prossegue: “Para dormir depois é difícil. É tanta coisa linda que acontece, é como se eu estivesse em vários mundos”.Falando do inusitado, para este ano, o músico planeja a gravação de um álbum com os sons do corpo – das veias, do cérebro, da pele e das batidas do coração.
Continuo sentada, num banco de rua, escutando também os diversos sons desta manhã de sol e refletindo sobre o poder mágico da improvisação.
A entrevista continua: “Ponho uma mesinha com os instrumentos, mas nunca toco todos. Não dá tempo. Ali o Hermeto não é o único solista. Ali todos são” (Depoimento dado à repórter Eleonora Duarte do Jornal Hoje em Dia)
Hermeto Pascoal aparece como uma figura “sui generis” no cenário da música contemporânea. Com seu entusiasmo, ele promove a integração com toda a platéia e com todos os componentes do grupo. Todos são criadores, improvisadores, todos são Um!Esta integração é uma das conquistas do século XXI, quando o individualismo desaparece para ceder lugar ao Todo. O estado de êxtase alcançado pela platéia relembra as sociedades primitivas, onde a música era usada para unir toda a comunidade numa só energia.
*Fotos da internet
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