terça-feira, 2 de outubro de 2018




FASE ESPACIAL I

Em 1969, por ocasião de uma exposição realizada em Belo Horizonte, solicitei ao poeta e diretor da Imprensa Oficial, Paulo Campos Guimarães, um texto para o catálogo, que transcrevo abaixo.

 “O melhor retrato do artista é a sua obra, porque nela se surpreende uma fisionomia moral. Por isso é que qualquer obra de arte, além de ser o testemunho da capacidade puramente intelectual do artista, é, sobretudo, a projeção de sua personalidade. Daí o acerto de Tolstoi, quando define a arte como a emoção relembrada. Nela corre o rio da comunicação estética de uma vivência.

         Maria Helena Andrés, na sua pintura de fuga à realidade bruta do mundo, procurando a estrela polar da paz, aparece de corpo moral inteiro, mostrando sua extraordinária vocação artística, com a graça divina do chamamento para esse recanto do mundo.

         Sua pintura é ela própria, nas suas concepções, na sensibilidade, no apurado sentimento de humanidade, na eterna fuga das coisas sem alma e dos fantasmas de toda espécie que povoam o profundo deserto da vida.

         A afirmação de sua forte personalidade e a impressionante unidade de sua obra artística emergem das cores vivas, mas transparentes, dos traços negros e incisivos, mas metálicos, de seus quadros. É que a realidade, circunscrita ao mundo material, não lhe basta. Ela, nas cores transparentes, quer ver além dos objetos e dos corpos. Nos traços metálicos, pretende iluminar essas realidades, com o brilho do espírito e da sensibilidade.

         Ainda, como Tolstoi, sua luta no campo da pintura é um romance de poesia no clima da guerra e da paz. Os capítulos épicos de seu ideário artístico são as próprias fases do seu trabalho criador. Começou pela figurativa, em que se aproxima de Guignard, distanciando-se da agressividade das coisas, através de retratos e paisagens do Parque. A angústia da artista dentro do mundo criou-lhe a revolta, na fase de deformação da figura humana. A guerra contra o lado mau do homem levou-a ao inevitável do abstracionismo, mas em atmosfera da busca desesperada de paz, na fase geométrica, pela pintura de cidades iluminadas, vistas de longe, e, na fase dos barcos, pelos quadros de viagem para o mar. O oceano, no entanto, não lhe deu a necessária tranqüilidade, que a artista só encontra na realização do seu sentimento do mundo. Nasceu, então, a rebelião do anjo da arte, traduzida nos quadros de guerra, definindo sua repulsa à destruição, porque, para ela, a civilização é a vitória da humanidade sobre a animalidade. A pintura de guerra feriu de tal forma a sua delicada sensibilidade que procurou refugiar-se na história, criando o misticismo das madonas barrocas, que parecem santas, com a conquista, pelo menos, da paz no passado. Esgotados os recursos da artista, na aventurosa pintura de guerra e paz, partiu para o quixotismo espacial. Não encontrando repouso na terra, habita hoje o mundo interplanetário, levando, em busca de paz, para longe da guerra permanente, os homens e as mulheres, na “Viagem Interplanetária”, o teatro, no “Espaço Azul”, o cinema, na “Projeção Espacial”, o navio, na “Barca Espacial”, e o avião, na “Nave Espacial”.

         Sua ansiedade diante do mundo adverso fez com que ela retratasse até a travessia da barreira do som. A luta que empreende na arte confunde-se, portanto, com a própria luta pela poesia do caráter. A artista Maria Helena Andrés tem, assim, o seu destino de luta na expressão da emoção e da comunicação da beleza muito parecido com o movimento angustioso da flor que nasce entre pedras.”

*Fotos de arquivo

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